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03/09/2014O problema de classificação dos consumidores: a legalidade dos sistemas de Scoring
*Brunno Pandori Giancoli, Consultor Jurídico do Viseu Advogados. Professor de Direito Civil e Direito do Consumidor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, do Complexo Jurídico Damásio de Jesus e da FIA/USP. Secretário Geral da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB-SP (2013-2015)
No dia 25 de agosto de 2014 ocorrerá a primeira audiência pública no STJ sobre a legalidade dos serviços de scoring no mercado de consumo brasileiro. O scoring é um sistema classificatório utilizado pelas empresas para determinar a probabilidade de adimplência ou inadimplência de um determinado consumidor numa relação de consumo envolvendo outorga de crédito. Diante da importância do crédito para a formação das relações de consumo, o serviço de scoring ganhou destaque nos Tribunais de Justiça nos últimos meses, especialmente no Estado do Rio Grande do Sul, nos quais se questiona a legalidade desse serviço diante das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor.
São várias as teses que tentam afastar a possibilidade de uso desta ferramenta. Todas elas, entretanto, deixam de lado duas questões centrais, as quais, ao meu ver, garantem a plena legalidade desses serviços. A primeira questão diz respeito ao próprio fenômeno social da classificação, o qual extrapola as relações de consumo em si. A segunda, está intimamente relacionada a necessidade de classificação dos riscos nas concessões de crédito para garantir a sustentabilidade do mercado de consumo.
Classificar é um processo natural de qualquer conduta humana. Em 1961 James Duff Brown estabeleceu que “a classificação nada mais é do que um processo mental executado de forma consciente e inconsciente por qualquer ser humano, para todos os tipos de propósito”. O processo classificatório já era praticado por alguns filósofos gregos como Aristóteles, um dos pioneiros na introdução deste mecanismo como elemento estrutural do conhecimento humano.
O ato de classificar é um dos principais mecanismos de tomada de decisão humana. Trata-se, pois, de um elemento útil, senão exclusivo, para a compreensão das coisas e das pessoas. Qual o melhor restaurante? Certamente aquele que mais tem estrelas nos guias internacionais, a exemplo do notório “Guia Michelin”. Qual o melhor vinho? Provavelmente aquele que recebeu mais pontos dos críticos renomados, como é o caso da classificação proposta por Robert Parker. Quem é o melhor aluno da sala de aula? Certamente aquele que tirou as notas mais altas durante o ano letivo. Mas também é verdade que um sistema classificatório não retrata com precisão cirúrgica a realidade das coisas. Talvez existam excepcionais restaurantes que nunca foram citados no “Guia Michelin”, vinhos magníficos que nunca foram degustados por Robert Parker e excelentes alunos que no dia da prova, por azar, estavam doentes e não puderam ter um bom desempenho. Porém, numa sociedade complexa, multifacetada a classificação e a pontuação são balizas necessárias e inevitáveis para a sobrevivência das instituições sociais e jurídicas.
Ao lado da questão envolvendo a necessidade de classificação das coisas e das pessoas em nossa sociedade, não podemos olvidar do fato de que a concessão de crédito é o resultado de uma decisão discricionária de uma determinada empresa na qualidade de credora de uma determinada relação jurídica. Todavia, modernamente se discute a responsabilidade no ato de concessão, o qual, muito embora discricionário, não pode ocorrer de forma irresponsável. Daí porque mecanismos como o scoring garantem as tomadas de decisões mais sérias e sustentáveis. Isso porque quando os agentes responsáveis pelas operações de crédito não avaliam de forma correta a capacidade de adimplemento dos consumidores, o crédito transforma-se em risco.
A classificação de risco não é uma opção, mas sim um dever sujeito, inclusive, a imposição de eventuais sanções. Tanto isso é verdade que o BACEN editou a Resolução 2.682/99, a qual determina, no seu art. 1º, que as instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil devem classificar as operações de crédito, em ordem crescente de risco.
É justamente neste contexto classificatório do risco que surgem serviços como o scoring. Esses serviços viabilizam a correta classificação do crédito nos moldes exigidos pelo BACEN, garantindo, uma avaliação da capacidade de adimplemento do consumidor, para a concessão de crédito sustentável e responsável. O scoring serve, pois, como um mecanismo para assegurar, não só um desenvolvimento econômico duradouro e harmônico, mas também como instrumento eficiente para controlar o estímulo a um consumo desestabilizado, o qual resultaria num processo de envididamento excessivo do consumidor e a violação da sua dignidade.