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25/10/2019Tema já teve idas e vindas e modulação que pode ser feita por Taffoli é criticada
Por Adriana Aguiar, Beatriz Olivon e Joice Bacelo — de São Paulo e Brasilia
O voto da ministra Rosa Weber sinaliza que o Supremo Tribunal Federal (STF) poderá mudar de posicionamento e decidir contra a prisão após condenação em segunda instância. Porém, para advogados criminalistas, o placar apertado de seis votos a cinco que se desenha mostra ainda um tribunal dividido.
O tema já teve idas e vindas. Em 2009, a Corte decidiu que a execução da pena estaria condicionada ao trânsito em julgado (quando não cabe mais recurso). Em fevereiro de 2016, a jurisprudência foi modificada pelos ministros, que trataram do tema pelo menos mais três vezes, a última delas no julgamento do habeas corpus (HO do ex-presidente Lula, em abril de 2018.
“O que ocorre é que não se pode julgar pensando em quem vai se beneficiar ou não no julgamento. O julgamento deve se basear na estrita legalidade”, diz o advogado criminalista David Rechulski, do escritório que leva seu nome. De acordo com ele, “não pode haver mudança no posicionamento porque o julgamento ocorreu em determinado momento da história para que alcance ou deixa de alcançar determinados indivíduos”. “Isso é fazer Justiça sem a venda nos olhos.”
Advogado criminalista e professor da FGV Direito SP, Davi Tangerino, diz que o voto da ministra era um dos mais esperados ontem porque quando 0 habeas corpus do ex-presidente Lula foi julgado, em abril do ano passado, ela votou pela condenação em segunda instância.
Na sessão de ontem, em que a matéria é tratada pelos ministros por meio de três ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs), Rosa Weber votou por mudar a jurisprudência.
Para ela, o início do cumprimento da pena só é possível a partir do trânsito em julgado do processo (quando não há mais chances de recurso).
“Se todos os ministros mantiverem os seus votos da mesma forma do julgamento do HC do ex-presidente Lula, o placar vai inverter”, afirma Tangerino. Permaneceriam os seis a cinco, mas contra a prisão em segunda instância.
O voto da ministra Rosa Weber foi coerente com o posicionamento dela no habeas corpus, segundo o jurista e ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Gilson Dipp. “Ela foi coerente. Disse que prezava pela decisão da colegialidade em 2016”, afirma. A coerência era esperada, acrescenta Dipp e, ao que tudo indica, com esse voto, haverá a mudança na jurisprudência.
“Só espero que o presidente não venha inventar e propor alternativas para que a condenação seja possível após decisão do STJ”, diz Dipp. Isso, acrescenta, seria uma ação voltada a agradar a opinião pública com medo da repercussão pelo caso Lula. “Se isso ocorrer, será a pior inconstitucionalidade de todas.”
Entre as duas alternativas do julgamento essa seria a única realmente inconstitucional, de acordo com o jurista. Qualquer mudança nesse sentido, afirma, teria que ser feita por emenda constitucional, se o artigo 5° não for interpretado como cláusula pétrea. Nessa situação, só com uma nova constituinte. Para ele, o STF deveria dizer claramente qual é a natureza jurídica da prisão após o segundo grau, se prisão provisória ou definitiva.
A modulação, explica Dipp, não se aplica a princípios fundamentais da Constituição. “Não se modula, não se biparte. Ou o STF tem coragem e ousadia de aplicar a Constituição ou fica refém de uma pretensa opinião pública”, diz o ex-ministro. Por isso, completa, a decisão do julgamento deveria se aplicar a todos os casos.
De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 4,9 mil presos poderiam ser beneficiados com o fim da prisão em segunda instância. O advogado Davi Tangerino não acredita, no entanto, que a decisão do Supremo – se confirmada a mudança de jurisprudência – tenha efeito imediato a todos eles.
O especialista diz que os juízes, se quiserem, poderão conceder a liberdade de ofício (sem que haja o pedido do réu). Mas pondera ser pouco provável que isso aconteça. “Até porque não há um controle automático, não se apert um botão no teclado do computador e encontra todo mundo que está nessa condição. O mais provável é que cada réu peça ao juiz da execução a sua liberdade, bastando demonstrar que não houve o trânsito em julgado”, afirma.
Davi Tangerino chama a atenção ainda que o juiz, depois de receber o pedido do réu, antes de decidir pela soltura, “certamente vai ouvir o Ministério Público”. “E em vários casos motivos cautelares vão surgir”, diz. “Não há como afirmar que todos serão realmente soltos.”
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