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16/03/2020Artigo: A reforma administrativa na visão da desoneração do Estado
16/03/2020
Medidas mais extremas, como determinação para fechar o comércio ou confinamento obrigatório, seriam contestadas no STF, dizem especialistas
15/03/2020 – 08:31 / Atualizado em 15/03/2020 – 09:35
Governos estaduais e municipais já começam a tomar medidas mais severas para tentar coibir o avanço do Coronavírus, como o fechamento obrigatório de escolas e cinemas, e até o isolamento compulsório de pacientes infectados, mas a legislação brasileira impõe limites a decisões drásticas “à la China”.
Uma nova lei baixada pelo governo federal no mês passado ampliou os poderes do governo, mas ainda há limites bem claros — para tomar medidas drásticas, o governo dependeria do aval do Congresso Nacional; essas e outras medidas podem, inclusive, enfrentar resistência no Supremo Tribunal Federal, onde ministros veem com ressalvas algumas das medidas em discussão. Ao contrário da China, uma ditadura, no Brasil a liberdade de ir e vir é garantida pela Constituição.
A lei de fevereiro permite, por exemplo, o isolamento e a quarentena de pacientes com diagnóstico ou suspeita da doença. No entanto, uma série de medidas ainda estão em aberto e, agravando-se o quadro, medidas mais severas podem depender de mudança na legislação federal ou local. É o caso das internações hospitalares compulsórias. A lei 13.979, de fevereiro deste ano, permite a investigação médica compulsória, com testes laboratoriais, vacinas e tratamentos médicos específicos. No entanto, não prevê que o paciente permaneça no hospital obrigatoriamente.
A mesma lei prevê restrição excepcional e temporária de entrada e saída do país, se a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) considerar necessário, por rodovias, portos ou aeroportos. A medida seguiria os moldes da adotada nos Estados Unidos, que proibiu a entrada no país de voos vindos da Europa.
Mas para por aí. A adoção de medida que impeça realização de reuniões públicas ou a determinação de “medidas extremas”, segundo um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) ouvido em caráter reservado, só poderia ocorrer se fosse decretado um Estado de Defesa. Segundo ele, sem o decreto, pessoas afetadas por restrições mais severas poderiam inclusive entrar com habeas corpus para garantir o direito constitucional de ir e vir.
O Estado de Defesa está previsto na Constituição Federal e pode ser decretado pelo presidente da República, ouvidos antes o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional, “para preservar ou prontamente restabelecer, em locais restritos e determinados, a ordem pública ou a paz social ameaçadas por grave e iminente instabilidade institucional ou atingidas por calamidades de grandes proporções na natureza”. Esse tipo de medida, no entanto, jamais foi usado para uma emergência médica.
No decreto do Estado de Defesa precisa estar especificado o tempo de duração, com o máximo de 30 dias prorrogáveis por mais 30, e as medidas que passarão a vigorar. Entre elas, pode haver proibição do direito de reunião, do sigilo de correspondência e das comunicações telefônicas. O decreto, para entrar em vigor, ainda precisaria ser aprovado pelo Congresso Nacional por maioria absoluta.
Também está previsto na Constituição o Estado de Calamidade Pública, que autoriza a abertura de crédito extraordinário “para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra ou comoção interna”.
Se for decretada a possibilidade de internações compulsórias, a medida poderá ser derrotada no STF. Isso porque dois ministros ouvidos em caráter reservado consideram a medida extrema, assim como o cancelamento de atos públicos e o toque de recolher. Segundo eles, seria uma ofensa ao direito de ir e vir, previsto na Constituição.
Não há previsão em lei federal ou na Constituição para a suspensão de serviços públicos e privados, toque de recolher ou suspensão das atividades nas escolas. No entanto, o ex-ministro do STF Carlos Velloso não vê problema na adoção de medidas extremas diante de uma pandemia – inclusive para internações compulsórias.
“Numa situação anormal, em que alguém que esteja muito mal, com uma doença altamente contagiosa, a pessoa pode não desejar se confinar para cuidar da saúde e para impedir que aquilo se espalhe. Mas a medida deve ser adotada em benefício do paciente e da coletividade. No caso de suspensão de aulas nas escolas, é a mesma coisa. Nós vivemos numa época em que há um contrato entre os direitos individuais e os coletivos, ambos são sagrados. Neste caso, me parece que o direito coletivo se sobrepõe aos individuais. Não vejo desrespeito a garantia constitucional. O governo não pode ficar impassível diante dessa situação”, diz Velloso.
O ex-ministro pondera que a possibilidade de fechamento do comércio é uma medida mais delicada, porque poderia prejudicar os indivíduos e a coletividade. Mas considera plausível a proibição de reuniões com muitas pessoas.
“Nós estamos diante de uma peste, de uma pandemia. É preciso conter essa pandemia. É possível proibir reuniões em que a contaminação pode ocorrer”, afirma.
Velloso explica que normas estabelecendo restrições podem ser editadas pelo governo federal, pelos estados ou pelos municípios. Exemplo disse foi a medida adotada pelo governador do Distrito Federal Ibaneis Rocha, que determinou a suspensão das aulas em escolas públicas e particulares por cinco dias.
“Os estados e municípios também têm responsabilidade no que concerne à saúde. Numa situação de emergência que surge inesperadamente, como essa moléstia que se espalha pelo mundo, é preciso de precaver, e o Estado precisa tomar medidas acauteladoras, desde que realmente visem o bem público”, afirmou o ex-ministro.
O advogado Fernando Bianchi, especialista em Direito Médico, pondera que esse tipo de restrição pode ter a constitucionalidade questionada no STF. Ainda assim, ele concorda que, num caso de pandemia, o interesse público deve se sobrepor ao privado.
“A legislação coloca o interesse público sobre o privado. É um assunto que borbulha, porque interfere no direito individual e pode ter a constitucionalidade questionada”, diz.
Para Bianchi, eventual ordem de fechamento do comércio seria juridicamente mais problemática. Ele ponderou que a medida poderia afrontar a garantia fundamental do direito de subsistência. Ele também pondera que a suspensão das aulas poderia contrariar o direito à educação, também garantido pela Constituição.
“Não existe um “pode ou não pode”, mas disposições que podem levar a interpretações”, declara.
O que a lei permite:
– Isolamento de pacientes com Coronavírus ou com suspeita de contágio
– Quarentena dos pacientes
– Investigação médica compulsória, com exames, testes laboratoriais, vacinas e tratamentos médicos específicos
– Restrição excepcional e temporária de entrada e saída do país, se a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) considerar necessário, por rodovias, portos ou aeroportos
O que não tem previsão em lei federal:
– Internação compulsória hospitalar
– Suspensão de serviços públicos
– Suspensão de serviços privados, como entregas em domicílio
– Fechamento de comércio
– Suspensão de aulas
– Toque de recolher
– Uso de máscaras
O que a Constituição Federal permite em situações excepcionais, mediante decreto:
– Proibir reuniões de pessoas
– Obrigar a permanência de pessoas em determinados locais
– Intervenção em empresas e serviços públicos.
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