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COMPLIANCE PARA A EQUIDADE
Os últimos anos trouxeram para o mundo empresarial a necessidade de estabelecer novas possibilidades de governança corporativa, o que está diretamente relacionado à busca da estabilidade do valor de mercado. Essa valoração, sobretudo por parte da comunidade consumidora, demanda, a cada dia, mais a inclusão de grupos anteriormente marginalizados nos quadros empresariais. Sendo, assim, amplamente valorizada a presença de uma diversidade real e permanente no ambiente corporativo.
Não à toa. Recente estudo realizado pela DDI, empresa de análise e pesquisa, e pela Ernst & Young (EY), concluiu que a diversidade – principalmente de gênero – impulsiona diretamente o resultado de um negócio. O estudo fez um panorama sobre a liderança global sob várias perspectivas, como diversidade, transformação digital, propósito, cultura, entre outros.
De igual maneira, estudo publicado na Harvard Business Review, realizado com empresas americanas, estabeleceu que as políticas de diversidade, racial ou de gênero, tornam as companhias mais competitivas, inovadoras e tecnológicas. Isso resulta em uma chance 45% maior de aumento da participação de mercado da empresa durante o ano.
Esses resultados, entretanto, demandam das empresas um investimento em processos técnicos e de gestão de riscos capazes de diagnosticar os conflitos relacionados à diversidade, seja ela racial, de gênero, de orientação sexual, de classe ou tantas outras formas possíveis. Aos processos citados, cujo objetivo é o tratamento digno de todas as pessoas, deu-se o nome de compliance antidiscriminatório.
Analisando-os de forma mais aproximada, os processos de discriminação influenciam desde a contratação de novos funcionários até sua permanência na empresa, uma vez contratados. É necessário, por isso, que se crie na empresa um mecanismo capaz de afastar, da melhor maneira possível, e controlar condutas preconceituosas e discriminatórias, solidificando a governança corporativa e o integral respeito aos colaboradores e consumidores.
Há ampla fundamentação jurídica para dar justificativa à efetivação dessa nova forma de compliance. A maior delas está na Constituição Federal, que, já em seu preâmbulo, estabelece como norte a garantia de igualdade a todos, conformando-se com ela uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Essa posição é firmada logo no artigo 1º – que dispõe sobre os princípios fundamentais da República – quando funda nossa sociedade na dignidade da pessoa humana e nos valores sociais do trabalho.
As previsões não se esgotam aí. Prevê, o artigo 3º, inciso IV, como um dos objetivos fundamentais da República, a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Seguindo-se o artigo 5º, caput, assegurando que todos são iguais perante a lei.
Essa igualdade, conforme ampla exploração pela hermenêutica jurídica, não pode ser reduzida apenas às práticas de igualdade formal, devendo prevalecer a chamada equidade, que se traduz no ensinamento aristotélico de desigualar os desiguais de maneira a igualá-los.
É ali na Constituição que está estabelecido também o valor do trabalho como instrumento de emancipação pessoal e social, sendo sua valorização, conforme preconiza o artigo 170, fundamental à ordem econômica, bem como parte da função social da empresa.
Além da Constituição, há grande arcabouço legal para tratar do tema da discriminação, merecendo destaque a de raça ou de cor, sendo hoje aplicada também em outras formas de discriminação que lhe foram equiparadas pelos tribunais superiores. Tais leis, além de trazerem o incentivo à contratação de pessoal mais diverso, trazem penalizações – administrativas e penais – para práticas discriminatórias no ambiente empresarial.
Globalmente, temos ainda as recomendações e resoluções da Organização Mundial do Trabalho (OIT) e das Nações Unidas (ONU). Esta última, previu, no artigo 7º da Declaração Universal de Direitos Humanos, igualdade perante a lei, sem qualquer distinção, com igual direito de proteção contra qualquer discriminação. Assim também o fez o Pacto de San José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário.
Não se trata, por óbvio, de tirar das empresas o exercício de seu poder diretivo, considerando que, tanto na CLT quanto em regulamentações internacionais, encontram-se ressalvas quanto às chamadas discriminações lícitas, a exemplo do disposto no artigo 2º da Convenção nº 111 da OIT. Fala-se, isso sim, em melhorar as possibilidades empresariais a partir de escolhas consistentes, capazes de diversificar o quadro de funcionários. O que, em primeiro lugar, confere uma maior conexão da empresa com os consumidores e, por extensão, melhores resultados financeiros, e, em segundo lugar, proporciona melhores possibilidade de alcançar a função social da empresa, prevista tão corretamente em nossa Carta Maior.
Thaís Pinhata é advogada criminalista em Franco Advogados, doutoranda e mestre em Direito pela Universidade de São Paulo e pesquisadora do Laboratório de Direitos Humanos da UFRJ Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações
Fonte: Valor econômico
https://tributarioresponde.com.br/compliance-para-a-equidade/