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Unidas, entidade que representa 100 operadoras de autogestão, protocolou ação de inconstitucionalidade nesta sexta-feira
Por Luciana Casemiro — Rio
04/11/2022 18h12 Atualizado há 2 dias
Prédio do Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília. Givaldo Barbosa
As operadoras de planos de saúde impetraram no Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade para suspender os efeitos da lei 14.454/2022, sancionada em 21 de setembro, que obrigada as empresas do setor a oferecerem coberturas fora do rol de procedimentos estabelecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).
A ação foi protocolada, nesta sexta-feira, pela União Nacional das Instituições de Autogestão em Saúde (Unidas), entidade que representa mais de cem operadoras, sem fins lucrativos. Nas autogestão a assistência à saúde é oferecida pelas empresas a seus empregados ou servidores ou gerida por uma categoria profissional. As operadoras representadas pela Unidas somam mais de quatro milhões de usuários.
Segundo Anderson Mendes, presidente da Unidas, a ideia é obter a suspensão, a exemplo do que aconteceu no caso do piso de enfermagem, para reabrir a discussão dos critérios de cobertura de procedimentos fora do rol. Da maneira como está na lei, diz Mendes, as pequenas operadoras, que são a maioria no caso de autogestão, podem vir a quebrar alerta:
– Essa é uma discussão técnica. Nós não temos o foco no lucro. Mas os critérios estabelecidos ficaram tão abertos que promovem não só um risco para a sustentabilidade econômico, mas para a segurança. ANS e Conitec (comitê que avalia as incorporações para o SUS) têm critérios rigorosos de avaliação de eficácia,e vidência científica, custo e benefício e outros que foram resumidos nessa lei a três parágrafos, sendo que é necessário atender apenas um dos três critérios para ter incorporação – ressalta.
Estou feito pela QuantiSaúde, a pedido da Unidas, mostra que para 20,87% das operadoras de autogestão a cobertura de tratamento para um usuário com Zoegensma, um dos remédios mais caros do mundo, já aprovado pela Anvisa, indicado para o tratamento de crianças com atrofia muscular espinhal (AME), representaria 50% da sua arrecadação anual. Para cerca de 8%, consumiria toda a receita do ano.
– Usamos esse remédio porque ele se encaixa nos critérios da lei, é elegível. Tem registro na Anvisa, em agências internacionais e evidência científica. Queremos mostrar qual pode ser o impacto para as operadoras e a necessidade de modular, rediscutir a lei – destaca Mendes.
Segundo o advogado José Luiz Toro, consultor jurídico da Unidas, há várias questões colocados na lei que caracterizam a inconstitucionalidade da norma. A primeira, aponta, é o fato de criar para o setor privado critérios mais abrangentes de cobertura do que os estabelecidos para o SUS.
– Essa lei viola o caratéria de complementariedade da saúde suplementar ao criar uma obrigatoriedade maior do que aquela determinada para o SUS. Além disso, há no Estado um órgão para avaliar de forma técnica a incorporação de procedimentos para saúde suplementar que é a ANS, a lei toma para si essa competência, ignorando que em março deste ano uma outra lei foi publicado justamente tratando de prazos e critérios para incorporação – diz Toro.
Um outro ponto questionado pela ação, diz o advogado, é a aplicação da nova norma de cobertura a contratos firmados em data anterior a sua promulgação.
– No afã de proteger, a lei pode acabar desprotegendo muitos consumidores, os critérios não são razoáveis e podem impossibilitar a atuação de pequenas operadoras que constituem a maioria das autogestão, que tem menos de 20 mil usuários. O STJ já havia criado critérios para esses casos extra rol, mas embalado pelo clamor popular e inflamado pelo momento político o Congresso passou uma lei sem um análise aprofundada. Essa lei é desastrosa e pode acabar com a sustentabilidade do setor – avalia Toro.
Na avaliação do advogado Rafael Robba, especialista em Saúde, do escritório Vilhena Silva Advogados, seria inconstitucional se a lei tivesse determinado o rol da ANS como taxativo. O que significaria dizer que apenas os procedimentos ali listados seriam de cobertura obrigatária dos planos de saúde. Para ele, a nova lei não é motivo para se alegar que os planos de saúde vão quebrar:
– A interpretação sempre foi de que o rol era exemplificativo e os planos de saúde não quebraram, pelo contrário, cada vez lucram mais e se tornam conglomerados econômicos maiores.
Para Robba, é falacioso o argumento de a nova legislação cria obrigações maiores para saúde suplementar do que as impostas ao SUS.
– É uma mentira dizer que a lei está estabelecendo obrigatoriedade maior para o planos do que para o SUS, a abrangência do SUS vai muito além da assistência farmacêutica. O SUS tem uma competência muito maior relacionada à saúde pública – destaca.
Sobre o estudo apresentado pela Unidas, o advogado pondera:
-Eles sempre usam o caso dos Zoegensma para causar impacto ao falar de cobertura extra rol, quando se sabe que essa é uma doença rara, de baixa incidência no país e ainda que a maior parte da judicialização desse medicamento é contra o SUS, foram poucos casos que os planos tiveram que pagar, conta-se em um mão.
Lei enfraquece a ANS, diz ex-presidente da agência
Na avaliação de Rogério Scarabel, ex-presidente da ANS e sócio do M3BS Advogados, a lei enfraquece o papel da ANS e dificulta medidas fiscalizatórias:
– O Estado entendeu que seria um regulador desse mercado e criou a ANS para isso. Essa lei retira poderes da agência. E coloca uma questão, como fiscaliza as coberturas fora do rol? Acredito que a ANS já esteja trabalhando nisso, mas por exemplo, posso pedir uma junta médica para avaliar se aquele procedimento é o mais adequado ao usuário, como é possível fazer para o que está listado no Rol? Hoje o ressarcimento ao SUS são de procedimentos do rol e agora? É preciso uma discussão mais ampla, como é feita pela própria ANS quando discute qualquer incorporação, com análise técnica e participação social.
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Scarabel lembra que a ANS fez um grande avanço no sistema incorporação e destaca que só este ano, mais de 30 procedimentos foram incorporados para a cobertura obrigatória dos planos de saúde. Mendes, presidente da Unidas, também acha que se a questão é incorporação isso deve ser discutido sob o guarda-chuva da ANS.
FenaSaúde, que representa as maiores operadoras do setor, e a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) já tinham dito estudar uma ação judicial nesse sentido. No entanto, a Unidas está sozinha neste processo. Abramge disse, no entanto, que solicitará o ingresso como Amicus Curiae no processo, com o objetivo de contribuir com o debate trazendo argumentos técnicos, clínicos e jurídico.
– Como está posto, a discussão sobre o que vai ou não ser cumprido extra rol vai ficar para o juiz de primeira instância. Ele é quem terá julgar se há evidência científica suficiente ou se o registro em um determinada reguladora estrangeira é suficiente. Nada disso está estabelecido claramente na lei e como é uma coisa ou outra. A única coisa que estamos de fato de acordo é que os procedimentos incorporados pelo Conitec para o SUS também sejam cobertos pelos planos de saúde – afirma o presidente da Unidas.