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28/12/2022Por Alessandra D’Elia.
15:51 – 26 De Dezembro De 2022
Empresas devem reavaliar suas práticas e adequá-las às novas obrigações
A qualificação profissional feminina, o apoio à prevenção e ao combate ao assédio sexual e outras formas de violência no local de trabalho são temas que ganharam maior destaque recentemente, com o advento da lei que criou o Programa Emprega + Mulheres (Lei 14.457/2022) e alterou algumas previsões da CLT, e devem ser tratados pelas equipes que cuidam da transição de governos no âmbito federal.
Nos atendimentos prestados diariamente pelo escritório a empresas de médio e grande porte, entretanto, a incerteza quanto aos avanços normativos obtidos para estes pontos tem sido pauta recorrente, em decorrência do atual quadro de polarização política no país.
Opiniões políticas à parte, o que não se pode desconsiderar é o mínimo consenso alinhado no Congresso Nacional para a promulgação das leis. Assim, cabe valorizar as inovações da norma, dentre as quais se destacam medidas de apoio à parentalidade como de auxílio-creche, amamentação, teletrabalho e flexibilização de trabalho e férias.
Para o auxílio-creche, mediante acordo individual ou norma coletiva, a lei autoriza a implementação de benefício à empregada ou ao empregado com filhos de até 5 anos e 11 meses de idade, para o pagamento de creche ou pré-escola, ou o ressarcimento de gastos com outra modalidade de prestação de serviços de mesma natureza, desde que comprovadas as despesas realizadas.
Observados os requisitos previstos na lei, os valores pagos a título de reembolso-creche não têm natureza salarial. Ou seja, não se incorporam à remuneração e não constituem base de incidência de INSS e FGTS. Mas ainda é necessário um ato do Poder Executivo dispondo sobre os limites de valores para a concessão do benefício e as modalidades de prestação de serviços aceitas, incluído o pagamento de pessoa física, e por isso as empresas devem ficar atentas à evolução do tema.
Para a amamentação, a nova lei também prevê que os estabelecimentos com pelo menos 30 mulheres com mais de 16 anos de idade devem ter local apropriado para os seus filhos no período da amamentação. Ficam desobrigadas de ter esse local as empresas que adotarem o benefício do reembolso-creche para todos os empregados e empregadas com filhos de até 5 anos e 11 meses de idade.
Outra questão que merece destaque neste ponto é que, nas atividades que possam ser realizadas por meio de trabalho remoto, os empregadores devem priorizar empregadas e empregados com filhos, enteados ou crianças sob guarda judicial com até 6 anos ou com deficiência, sem limite de idade.
E, ainda, observado o poder diretivo da empresa e a vontade expressa dos empregados interessados, é possível flexibilizar a jornada de trabalho dos profissionais que tenham filhos, enteados ou pessoas sob sua guarda com até 6 anos de idade ou com deficiência. Essa flexibilização pode ser implementada por meio de compensação de jornada via banco de horas, horários de entrada e saída flexíveis e antecipação de férias individuais, mediante acordo individual ou coletivo.
Quanto às medidas para qualificação de mulheres, a lei também prevê, mediante requisição formal da empregada interessada, a possibilidade de suspensão do contrato de trabalho para estimular a qualificação em áreas estratégicas ou com menor participação feminina. Durante esse período de suspensão, a empregada fará jus à bolsa de qualificação a ser custeada pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), podendo o empregador conceder à empregada ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial.
Essa suspensão precisa ser formalizada em acordo individual ou norma coletiva e, se ocorrer a dispensa da empregada durante o período de suspensão contratual ou nos 6 meses subsequentes ao retorno ao trabalho, o empregador pagará à empregada, além das verbas rescisórias legais, multa a ser estabelecida em convenção ou em acordo coletivo. A multa será de, no mínimo, 100% do valor da última remuneração mensal anterior à suspensão do contrato de trabalho.
A lei também permite que os homens tenham um benefício parecido ao acima exposto após o término da licença-maternidade de sua esposa ou companheira, para prestar cuidados e estabelecer vínculo com os filhos e apoiar o retorno ao trabalho da sua esposa ou companheira. Para isso, ele deve participar de curso ou programa de qualificação profissional, oferecido pelo empregador, com carga horária máxima de 20 horas semanais e de forma não presencial. Os demais requisitos de formalização via acordo individual ou norma coletiva, custeio da bolsa, ajuda compensatória complementar e multa por dispensa no prazo de 6 meses são iguais às já expostas para as mulheres.
Em relação ao Programa Empresa Cidadã, foi acrescentada a opção de substituir o período de prorrogação da licença-maternidade, de 60 dias (Lei 11.770/2008), por uma redução da jornada de trabalho de 50% pelo período de 120 dias, mediante acordo individual e pagamento do salário integral. Os 60 dias de prorrogação da licença-maternidade oferecida pelas empresas cidadãs poderão ser compartilhados entre a empregada e o empregado requerente, desde que ambos sejam empregados de pessoa jurídica aderente ao Programa Empresa Cidadã e que a decisão seja adotada conjuntamente, na forma a ser estabelecida em regulamento.
A nova lei também prevê disposições relativas à prevenção e ao combate ao assédio sexual e às demais formas de violência no âmbito do trabalho. Essa é uma inovação das mais interessantes da lei, principalmente sob o ponto de vista do compliance trabalhista.
Nesse ponto, a lei dá maior enfoque para temas comportamentais em âmbito laboral, alterando o nome da Cipa para Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio e incluindo o tema de prevenção e do combate ao assédio sexual e outras formas de violência no âmbito da comissão.
Agora, as empresas obrigadas a constituir e manter Cipa deverão adotar as seguintes medidas, além de outras que entenderem necessárias: inclusão de regras de conduta a respeito do assédio sexual e de outras formas de violência nas normas internas da empresa, com ampla divulgação do seu conteúdo aos empregados e às empregadas; fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias, com apuração dos fatos e aplicação de sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio sexual e de violência, garantido o anonimato do denunciante; realização, no mínimo a cada 12 meses, de ações de capacitação em formatos acessíveis aos empregados de todos os níveis hierárquicos sobre temas relacionados à violência, assédio, igualdade e diversidade no trabalho.
Ou seja, a lei trouxe a previsão de implementação de um programa de prevenção ao assédio sexual nas práticas da Cipa e essas medidas devem ser adotadas em até 180 dias, contados do dia 22 de setembro de 2022.
A lei ainda frisa que o recebimento de denúncias pelas empresas não substitui o procedimento penal correspondente, caso a conduta denunciada pela vítima se encaixe na tipificação de assédio sexual do art. 216-A do Código Penal, ou em outros crimes de violência tipificados na legislação brasileira.
Diante dessas inovações, as empresas devem reavaliar suas práticas e políticas para adequá-las às novas obrigações, mantendo-se atentas às oportunidades de novos benefícios e práticas alinhadas às diretrizes do Programa Emprega + Mulheres.
Alessandra D’Elia é advogada, coordenadora da área Trabalhista do WFaria Advogados.