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11/04/2023Supremo também analisa outras multas consideradas abusivas
3.abr.2023 às 6h00Atualizado: 3.abr.2023 às 14h53
SÃO PAULO
A Receita Federal aplicou de 2010 a 2020 R$ 43,7 bilhões em multas adicionais de 50% para contribuintes que tiveram negados pedidos de compensação de tributos. Essa cobrança foi considerada inconstitucional pelo STF (Supremo Tribunal Federal) na semana passada.
O número foi obtido junto ao governo federal pela Abat (Associação Brasileira Advocacia Tributária), que atuou no processo como parte interessada, e não inclui os valores de 2021 e 2022, o que pode levar o total de autuações a superar R$ 50 bilhões, considerando a média anual do período anterior.
O governo calcula um impacto de R$ 3,7 bilhões no caixa, colocando na conta a devolução das multas pagas nos últimos cinco anos e a perda de arrecadação em 2023. A diferença entre os dois números são valores que ainda estavam em discussão nas esferas administrativa e judicial.
A fachada do STF, em Brasília – Felipe Sampaio – 8.dez.2022/SCO/STF
O STF considerou inconstitucional a multa isolada de 50% aplicada quando a Receita Federal indefere pedidos de compensação de tributos, com o argumento que a penalidade fere o direito à petição. Nesses casos, o Fisco também aplica multa de mora de 20%, o que representa uma dupla punição para o contribuinte. O valor do débito é ainda corrigido pela taxa básica de juros.
O levantamento da Abat também mostra que 24% dos pedidos de compensação analisados pela Receita Federal de 2010 a 2020 não foram homologados pelo Fisco, um total de R$ 137,4 bilhões questionados pela instituição.
A decisão do STF tem repercussão geral. Ou seja, o entendimento será aplicado sobre outras que tratam do mesmo tema. A Fazenda Nacional ainda pode fazer questionamentos sobre a decisão, que será de observância obrigatória para os auditores e fiscalizações em andamento quando for publicado o acórdão.
Responsável pelo pedido e pela organização dos dados sobre autuações, o advogado Breno Vasconcelos, que atuou no caso como representante da Abat, diz não ver razões para um pedido de modulação de efeitos por parte da Fazenda Nacional.
Segundo ele, a modulação só existe em situações de relevante interesse social ou para preservar a segurança jurídica. Nesse caso, não houve mudança de jurisprudência, e o impacto financeiro já estava na Lei Orçamentária há algum tempo. Além disso, a posição de cinco ministros pela inconstitucionalidade já era conhecida pelo Fisco desde 2020.
“Temos uma manifestação muito eloquente por parte do Supremo sobre a inconstitucionalidade dessa multa. Não vejo qual seria o argumento plausível para requerer a modulação”, diz o advogado. “A União apostou nesse contencioso, não foi pega de surpresa.”
OUTRAS MULTAS CONFISCATÓRIAS
Filipe Richter, sócio da área tributária do Veirano Advogados, afirma que outras multas também estão sendo questionadas no Judiciário por seu caráter confiscatório. Entre elas, estão a ação contra a autuação isolada de 5% a 40% por descumprimento de obrigação acessória (Tema 487/RE 640.452), aplicada sobre o valor da operação.
“Uma obrigação acessória, um mero erro de preenchimento de uma declaração, não pode gerar uma penalidade desse tamanho. São multas que acabam passando da linha entre razoabilidade e confisco”, afirma Richter.
Segundo o tributarista, o STF já disse em algumas oportunidades que a multa que supera 100% do valor do tributo é confisco. Há casos envolvendo também o ICMS, o que já levou alguns estados, como São Paulo, a rever a legislação sobre o rol de penalidades deste tributo.
O presidente da Abat, Halley Henares, que também atuou no julgamento, afirma que a decisão serve como referência para tribunais e autoridades tributárias regionais, ao sinalizar limites para penalidades de tributos estaduais e municipais. Para Henares, o posicionamento dos ministros mostra ainda que não se pode presumir antecipadamente que todo contribuinte age com má-fé ou dolo.
“Mais do que a questão da multa isolada, a decisão do Supremo está indicando que sanções punitivas, como as multas, têm limites. Esse limite é não ter caráter confiscatório, observar a proporcionalidade e a razoabilidade.”
Rodrigo Maito, sócio do escritório Dias Carneiro Advogados, afirma que há uma tendência do Supremo de calibrar o peso das multas em matéria tributária, ao aplicar o princípio da vedação ao confisco.
“O Judiciário está se mostrando atento a sanções que não são proporcionais à infração cometida. A penalidade tem de servir para reprimir e prevenir que haja conduta ilícita, mas quando ultrapassa o valor do principal do tributo devido ela passa a funcionar como um instrumento de confisco”, afirma Maito.
Segundo o tributarista, a legislação sobre a multa isolada surgiu da iniciativa de punir aqueles que usavam de má-fé e faziam uso de créditos fictícios, por exemplo, para adiar o pagamento de tributos. Mas a lei acabou aplicando a punição a todos os contribuintes. “O governo decidiu criar uma norma que não identifica no caso a caso se há má-fé. A União quis combater um problema, mas criou outro.”
Em relação à multa já isolada de 50%, Maito avalia que a própria União poderia cancelar de ofício as cobranças, de forma a evitar uma derrota nesses casos que gerasse ainda o custo de condenação para os cofres públicos.
O STF (Supremo Tribunal Federal)
Sessão solene de abertura do ano judiciário de 2021, realizada em formato híbrido, ou seja, virtual e presencial Marcos Corrêa – 01.fev.2021/PRMAIS
Gustavo Brigagão, do escritório BDE (Brigagão Duque Estrada Advogados), afirma que a multa pelo pedido de compensação fere o direito constitucional à petição. “O fato de perguntar se o procedimento está correto não pode ser objeto de multa.”
Em relação ao voto divergente do ministro Alexandre de Moraes, pela inconstitucionalidade, exceto quando for comprovada falsidade, Brigagão afirma que o posicionamento poderia trazer insegurança jurídica e abrir brechas para manutenção das autuações.
“Nosso receio, como representantes dos contribuintes, é que a Receita e a Fazenda passem a ver falsidade em tudo, e você vai ter de continuar no contencioso para tentar demonstrar que naquela compensação não há falsidade alguma. Com essa ressalva feita pelo ministro abre-se uma janela para que todo o contencioso relativo a essa multa continue.”
OUTRAS DISCUSSÕES
1. Caráter confiscatório da “multa isolada” por descumprimento de obrigação acessória (RE 640.452 – Tema 487)
Discute se multa aplicada em valor variável entre 5% a 40%, relacionada à operação que não gerou crédito tributário possui, ou não, caráter confiscatório.
2. Multa de mora/ISS (RE 882.461/MG – Tema 816)
Além da discussão envolvendo a incidência do ISSQN em operação de industrialização por encomenda, serão examinados os limites para a fixação da multa fiscal moratória, tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório
3. Multa qualificada (RE 736.090/SC – Tema 863)
Limites da multa fiscal qualificada de 150% sobre a totalidade ou diferença do imposto ou contribuição não paga, não recolhida, não declarada ou declarada de forma inexata
Fonte: Veirano Advogados