O Empreiteiro| Sistema de câmeras Wi-Fi, integrado a Lean Construction,otimiza monitoramento e gestão em canteiro
18/04/2024Migalhas| Grupo da UERJ analisou precedentes relacionados à Justiça Trabalhista
24/04/2024Caso envolve o pagamento de R$ 9 milhões em FIDC da Planner que assumiu os direitos creditórios de 77 fornecedores com varejista; Americanas diz que prazos foram descumpridos
Por Sérgio Ripardo
21 de Abril, 2024 | 03:14 PM
Bloomberg Línea — Apesar do acordo com a maioria dos credores no fim de 2023, a Americanas (AMER3) ainda enfrenta disputas na Justiça relacionadas às suas dívidas. É o caso de um litígio com a Planner, uma das corretoras mais tradicionais da Faria Lima, depois que a varejista se recusou a depositar R$ 9 milhões na conta de um fundo de direitos creditórios (FIDC) administrado pela empresa.
O caso se refere a uma dívida original de R$ 18,7 milhões – mais de 35% já quitada pela Americanas – com um grupo de 77 pequenos fornecedores, segundo documentos vistos pela Bloomberg Línea.
Procurada pela Bloomberg Línea, a defesa da Americanas alegou que o FIDC da Planner teria descumprido prazos e procedimentos exigidos pelo plano de recuperação judicial para notificar a transferência de créditos das empresas para o fundo. E que honrou parte da dívida anterior.
Isso levou a Americanas a efetuar um depósito judicial de R$ 9 milhões (saldo remanescente) a fim de que a Justiça decida a quem deverá ser destinado esse montante. Procurada pela Bloomberg Línea, a Planner não quis comentar.
A Planner reuniu 77 credores da chamada classe IV (ME/EPP, sigla para microempresa e empresa de pequeno porte) no fundo de investimento em direitos creditórios, denominado FIDC No Stress, segundo a petição datada do dia 28 de março vista pela Bloomberg Línea.
Esses credores aceitaram um desconto no valor original da dívida para receber 40% do total devido pela Americanas em troca da cessão dos créditos ao fundo da Planner, segundo o advogado Renato Scardoa, sócio do escritório Scardoa e Del Sole Advogados, que representa um grupo mais de 15 fornecedores. A corretora lucraria em cima do deságio (desconto sobre o valor nominal de um ativo).
A controvérsia remete também a uma liminar anterior que travou o pagamento a credores trabalhistas (classe I), micro e pequenas empresas (classe IV).
Depois de entrar em recuperação judicial em janeiro de 2023, com uma dívida total acima de R$ 40 bilhões, a varejista decidiu antecipar e saldar os pagamentos devidos a credores das duas classes, o que começou a ser feito no dia 28 de fevereiro e se estendeu até 8 de março do ano passado.
Os pagamentos foram, no entanto, suspensos após uma decisão judicial favorável a pedido do banco Safra, apoiado na tese de que o grupo não tinha apresentado ainda seu plano de reestruturação.
Nesse período da vigência da decisão que autorizava o pagamento antecipado dos credores das classes I e IV, a Americanas disse que pagou um total de R$ 6,637 milhões a 39 dos 77 credores, antes de ser notificada sobre a cessão dos créditos para o fundo “No Stress”.
Também quitou R$ 1,337 milhão a 17 credores desse FIDC no último dia 1º março, mesma data em que o fundo informou nos autos sobre a cessão de créditos, considerada fora do prazo.
“Além de não terem observado o prazo mínimo de antecedência de 10 dias em relação a quase todas as cessões, o fundo No Stress deixou de cumprir outro requisito previsto em cláusula, a comunicação imediata das cessões de crédito nos autos da RJ”, escreveu a defesa da Americanas na petição.
Créditos de até R$ 3,6 milhões
Os credores do fundo da Planner são nomes que atuam em diferentes setores, como logística, transporte, manutenção, limpeza, reforma, consultoria, informática e gráfica.
Na lista de cessão de créditos do fundo “No Stress”, os valores individuais devidos pela varejista partem do valor mínimo de R$ 1.690 (para a Mecânica e Elétrica Emanuel) ao máximo de R$ 3,6 milhões (Polly Serviços de Apoio Logístico, que teve impugnação de parte do crédito). A maior parte das dívidas fica em uma faixa abaixo de R$ 300.000.
Já o depósito judicial de R$ 9,041 milhões efetuado pela Americanas corresponde aos valores pagos a esses credores no último 1º de março (R$ 1,337 milhão), somados ao que não tinha sido ainda pago nem às empresas que originaram o crédito nem ao fundo “No Stress”.
“Não há dúvidas de que o Grupo Americanas não tem qualquer responsabilidade pela existência de créditos cedidos e que o pagamento, total ou parcial, efetivado a 39 dos 77 credores cedentes, no valor total de R$ 6.637.882,37, foi válido, uma vez que promovido antes das referidas cessões, realizadas todas elas a partir de janeiro de 2024″, menciona a petição.
“Resta analisar, portanto, o saldo do crédito cedido, desconsiderando os valores pagos há mais de 1 ano, ou seja, R$ 12.138.111,64″, acrescenta a defesa.
A varejista reconheceu uma controvérsia instaurada sobre o valor final do crédito de três fornecedores, com os seguintes depósitos judiciais no âmbito das impugnações: Polly Consultoria em Serviços Terceirizados (R$ 1.476.792,47), Polly Serviços de Apoio Logístico Ltda (R$ 2.042.265,37) e MR Transportes (R$ 458.011,02).
Disputa com fornecedores
O caso com a Planner coincide com o momento em que a Americanas também enfrenta a pressão de um grupo de 15 fornecedores, que acusa a varejista na Justiça de descumprir compromissos previstos no plano de recuperação judicial ao deixar de pagar créditos trabalhistas e de micro e pequenas empresas dentro do prazo máximo fixado, de 28 de março.
Nos autos do processo de recuperação judicial, a defesa do grupo alega que a varejista assume o risco de ser alvo de um pedido de decretação de falência caso a situação não seja regularizada.
O caso se refere ao pagamento de créditos que foram assumidos pela varejista.
O advogado do grupo, Renato Scardoa, disse à Bloomberg Línea que seus 15 clientes votaram em dezembro a favor do plano de recuperação judicial da Americanas e cobram que o grupo varejista “faça a sua parte e honre com os compromissos assumidas”.
O advogado afirmou ainda que a falta de pagamento do saldo devido a esses credores faz acender um “sinal amarelo, seja em razão de uma melhor organização interna da Americanas para processar tais pagamentos, seja pela possível falta de capacidade financeira da empresa”.
“Os valores envolvidos não são tão significativos perto do valor global de endividamento, assim como o número de credores que estão nessa situação, e até por isso imagina-se que os pagamentos sejam regularizados”, afirmou Scardoa.
Em resposta ao pedido de comentário feito por Bloomberg Línea sobre o movimento desses credores, a Americanas disse que os pagamentos mencionados são “residuais” e que “as tratativas estão endereçadas, seja pelo ajuste cadastral de dados dos credores listados ou pelo não enquadramento, no caso específico, aos requisitos previstos no PRJ [plano de recuperação judicial] para a cessão de créditos”.
Segundo a nota enviada à Bloomberg Línea, o processo de pagamento de credores está ocorrendo “como previsto” pelo plano de recuperação judicial e já foram pagos mais de R$ 4 bilhões em créditos a credores trabalhistas, micro e pequenos empreendedores, e fornecedores. O grupo varejista prevê que a maior parte do plano seja implementada e executada até o final de junho.
As divergências representam um novo capítulo no processo de recuperação judicial, iniciado em janeiro de 2023, após a revelação de uma fraude contábil que deixou uma dívida com quase 8.000 credores.
É considerado um dos maiores escândalos da história corporativa recente do Brasil, ainda em apuração, envolvendo três dos empreendedores mais bem-sucedidos e ricos da história do país, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, do 3G Capital. O trio se comprometeu com uma injeção de capital de R$ 12 bilhões no plano de recuperação judicial.