Jota| STF: validade de voto de ministros aposentados pode causar perda de R$ 72 bilhões
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23/06/2022Levantamento do JOTA aponta impacto em ao menos 5 processos, gerando prejuízo à União nos próximos 5 anos
BRASÍLIA
15/06/2022 10:36Atualizado em 15/06/2022 às 11:26
Edifício sede do STF. Crédito: Nelson Jr./SCO/STF
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de manter os votos de ministros aposentados nos casos em que os julgamentos foram suspensos por pedidos de destaque impactará ao menos cinco processos tributários em tramitação na Corte. Levantamento do JOTA mostra que esses julgamentos podem representar perda de arrecadação de até R$ 72,1 bilhões para a União em cinco anos.
Entre os casos tributários que serão impactados está o que discute a inclusão do ISS na base de cálculo do PIS e Cofins. Entre outros recursos, a decisão do STF de manter a validade dos votos dos ministros aposentados afetará também o julgamento sobre a inclusão do crédito presumido de ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.
Quando um processo está no plenário virtual e um ministro pede destaque, o julgamento é levado ao plenário físico, e a contagem de votos é reiniciada. Assim, com a aposentadoria dos ministros Celso de Mello e Marco Aurélio Mello, era discutida a possibilidade de seus votos serem invalidados em casos destacados por outros magistrados.
Esse risco foi afastado com a decisão do STF da última quinta-feira (9/6) em questão de ordem suscitada pelo ministro Alexandre de Moraes. Assim, quando os julgamentos forem retomados no plenário, ainda sem data marcada, os votos dos magistrados aposentados serão contabilizados.
Com a decisão, a princípio, ficou definido que, no caso em que Celso de Mello e Marco Aurélio já votaram, os magistrados que os substituíram, Nunes Marques e André Mendonça, respectivamente, não votarão.
No entanto, durante o debate sobre a questão de ordem, o ministro Ricardo Lewandowski propôs que os novos magistrados opinem apenas em novos fatos trazidos aos autos. Essa questão ainda será decidida pelos ministros. Além disso, o ministro presidente, Luiz Fux, pediu aos colegas que enviem sugestões para o aprimoramento do plenário virtual.
ISS no PIS/Cofins
Entre os julgamentos da área tributária que podem ser impactados pela decisão, um dos principais é o que discute se o ISS integra a base de cálculo do PIS e da Cofins. Trata-se do RE 592.616, cujo julgamento foi suspenso em 27 de agosto de 2021 por um pedido de destaque do ministro Luiz Fux.
Antes da suspensão, o relator, ministro Celso de Mello, votou no sentido de excluir o ISS da base de cálculo das contribuições, seguindo o mesmo raciocínio do STF aplicado no julgamento da “tese do século”. Neste caso, o RE 574706, o Supremo entendeu que o ICMS não integra a base das contribuições por não ser faturamento, mas sim um valor repassado à Fazenda Pública. Assim, quando o julgamento sobre o ISS for retomado, o voto de Celso de Mello permanecerá válido.
No Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2023, a União estima que, se o STF decidir pela exclusão do ISS da base do PIS e da Cofins, a perda de arrecadação será R$ 35,4 bilhões em cinco anos.
Crédito presumido de ICMS
O julgamento que discute se o crédito presumido de ICMS deve compor a base de cálculo do PIS e da Cofins também será impactado pela decisão do STF de manter a validade dos votos dos ministros aposentados. A discussão é objeto do RE 835.818. A União estima perda de arrecadação de R$ 16,5 bilhões em cinco anos caso seja derrotada no recurso.
De um lado, o contribuinte alega que os créditos presumidos de ICMS recebidos não configuram receita ou faturamento, mas sim renúncia fiscal, de modo que não cabe a tributação. Do outro, a União, autora do recurso, sustenta que a base de cálculo do PIS e da Cofins é composta pela totalidade das receitas auferidas, o que inclui o crédito presumido de ICMS, uma vez que esse valor ingressa de forma definitiva no patrimônio líquido da empresa.
A análise desse tema já foi interrompida duas vezes em plenário virtual. Primeiro, em março de 2021, por um pedido de vista do ministro Dias Toffoli. Depois, em abril de 2021, por um pedido de destaque do ministro GIlmar Mendes, quando o placar já estava formado para uma decisão favorável ao contribuinte, ou seja, pela exclusão do crédito presumido de ICMS da base de cálculo das contribuições.
Antes da suspensão, o relator, ministro Marco Aurélio, votou para afastar a tributação do crédito presumido de ICMS. Para o magistrado, os créditos são renúncia fiscal e não podem ser entendidos como receita ou faturamento, não podendo entrar na base dos tributos federais. Agora, o voto dele permanecerá válido quando o julgamento for retomado.
Grandes fortunas
Outro caso em que o voto do ministro Marco Aurélio corria o risco de ser desconsiderado é o que envolve a edição de lei para tributar grandes fortunas. O assunto é discutido na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 55.
O debate gira em torno do artigo 153, inciso VII, da Constituição, que define que compete à União instituir impostos sobre grandes fortunas, nos termos de lei complementar. Essa lei, no entanto, nunca foi editada.
O julgamento começou em 25 de junho de 2020. Na ocasião, Marco Aurélio, relator, votou no sentido de julgar a ação procedente e, com isso, declarar a omissão do Congresso Nacional em não editar a lei. Depois disso, houve um pedido de destaque do ministro Gilmar Mendes, e o caso aguarda inclusão na pauta do plenário do STF.
PIS/Cofins sobre locação de bens móveis
O quarto caso tributário que será impactado pela decisão do STF é o que discute se incide PIS e Cofins sobre receitas com a locação de bens móveis. A discussão é objeto do RE 659.412. A União estima um impacto de R$ 20,2 bilhões nas contas públicas em cinco anos caso seja derrotada nesse processo.
O julgamento foi iniciado em junho de 2020 e interrompido por um pedido de destaque do ministro Luiz Fux. Antes da suspensão, o relator, ministro Marco Aurélio, votou no sentido de que o PIS e a Cofins só poderiam incidir sobre as receitas com locação de bens móveis, no regime cumulativo, a partir da instituição desse regime mediante as Leis 10.637/2002 e 10.833/2003. No regime não cumulativo, Marco Aurélio votou para que o PIS e a Cofins sejam cobrados a partir da Lei 12.973/2014, que estabeleceu como base de cálculo das contribuições o total das receitas auferidas pela empresa.
Assim, como nos demais casos, o voto de Marco Aurélio será mantido quando este julgamento for retomado em plenário.
Contribuição previdenciária sobre o terço de férias
Por fim, será impactado o julgamento dos embargos de declaração que discutem a modulação dos efeitos da decisão que definiu a incidência de contribuição previdenciária sobre valores pagos pelo empregador a título de terço constitucional de férias. O tema está em discussão no RE 1.072.485.
Em agosto de 2020, o STF julgou constitucional a cobrança. O que está pendente de julgamento é a modulação de efeitos dessa decisão, ou seja, a partir de quando, de fato, ela passa a valer.
O julgamento da modulação foi iniciado em plenário virtual em abril de 2021, mas foi interrompido por um pedido de destaque do ministro Luiz Fux. Antes da suspensão, o relator, Marco Aurélio, votou para que os efeitos da decisão não fossem modulados. Ou seja, para o magistrado, se a cobrança foi considerada constitucional, ela é válida desde sempre, não cabendo qualquer restrição aos efeitos da decisão. Com a retomada do julgamento, o voto de Marco Aurélio permanecerá válido.
Segundo estimativa da Associação Brasileira de Advocacia Tributária (Abat),caso a decisão não seja modulada, as empresas poderão ter um prejuízo entre R$ 80 bilhões e R$ 100 bilhões, considerando que terão de recolher a contribuição retroativamente desde 2014.
CRISTIANE BONFANTI – Repórter do JOTA em Brasília. Cobre a área de tributos. Passou pelas redações do Correio Braziliense, O Globo e Valor Econômico. Possui graduação em jornalismo pelo UniCeub, especialização em Ciência Política pela UnB e MBA em Planejamento, Orçamento e Gestão Pública pela FGV. Cursa Direito no UniCeub.
FLÁVIA MAIA – Repórter em Brasília. Cobre Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). Foi repórter do jornal Correio Braziliense e assessora de comunicação da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Faz graduação em Direito no IDP. Email: flavia.maia@jota.info
FELIPE RECONDO – Diretor de conteúdo em Brasília. Sócio-fundador, é responsável por todo o conteúdo produzido pelo JOTA. Autor de “Tanques e Togas – O STF e a Ditadura Militar” e de “Os Onze – O STF, seus bastidores e suas crises”, ambos pela Companhia das Letras. Antes de fundar o JOTA, trabalhou nos jornais O Estado de S.Paulo, Folha de S.Paulo, no blog do jornalista Ricardo Noblat. Email: felipe.recondo@jota.info