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De CEO´s a escritores. De advogados a professores. De arquitetos a programadores. Este novo estilo de vida – os nômades digitais – pode ser encontrado em quase todas as profissões. São mais de 35 milhões de adeptos pelo mundo. Segundo Relatório Global de Tendências Migratórias 2022 da empresa global especializada em migração – Fragomen, até 2035 é estimado que existam cerca de 1 bilhão de nômades digitais. Há países que já adotaram vistos específicos para os nômades digitais, dentre eles o Brasil, que por intermédio do Conselho Nacional de Imigração, regulamentou o visto temporário e autorização de residência aos imigrantes que se enquadrem nesta nova modalidade. A possibilidade de trabalhar pela internet, somada ao interesse de estar em várias partes do mundo, transformou o modo de vida e trabalho de diversas pessoas.
A legislação brasileira trabalhista, por sua vez, não possui única linha capaz de assimilar este novo formato de contrato. Até discussões sobre a legislação específica são travadas nas cortes e debates trabalhistas. Um nômade digital que trabalha para uma empresa brasileira, no estrangeiro, provavelmente, sequer está pesando nas regras ou direitos celetistas. Entretanto, caso esta discussão aconteça, terá muitas dificuldades em encontrar a resposta ou respaldo na legislação vigente.
Outro fenômeno que da economia 4.0 são os trabalhadores em plataformas digitais. São milhões deles em todas as áreas da economia. São motoristas de aplicativos, cuidadores, enfermeiras, trabalhadores domésticos, mecânicos, entregadores de toda a espécie, garçons, seguranças. A lista é interminável.
Em quase toda a profissão atual é possível se encontrar um aplicativo que organizou e encontrou uma forma de unir a mão de obra ao tomador do serviço. Esta alternativa de mercado, que utiliza da tecnologia inundou a maioria dos países ocidentais.
Esta possibilidade está relacionada com a economia colaborativa (sharing economy), a qual provoca profunda alteração no sistema clássico da relação de trabalho e emprego.
Desde março de 2020, quando a OMS declarou oficialmente que o mundo vivenciava uma pandemia de Covid-19, é possível observar uma inflação neste novo sistema de trabalho, principalmente em decorrência da necessidade do distanciamento das pessoas. E desde então nos deparamos com a absoluta falta de amparo ou aplicação da legislação existente ao caso concreto. Esta nova forma de trabalho ficou em mais um limbo legislativo. Não há uma regulamentação capaz de emprestar a esta nova realidade o adequado regramento.
Caímos, assim, na cansativa discussão da existência ou não de uma relação de emprego. Na aplicação ou não de todas as regras e direitos celetistas a tais trabalhadores. Houve uma enxurrada de processos judiciais na Justiça do Trabalho entre trabalhadores em plataforma digitais, pretendendo ser declarados empregados celetistas das empresas. Mais uma vez, o Estado demora ou se omite a dar a necessária resposta, qual seja, a criação de uma lei capaz de regulamentar esta nova situação, que se aloca entre a situação do autônomo e uma relação empregatícia.
No Reino Unido, em decisão bastante conhecida, a Suprema Corte determinou à empresa Uber que considerasse seus motoristas como “workers”, classificação específica daquele país que garante patamares (direitos) mínimos, tais como, salário-mínimo, férias anuais e aposentadoria. Na classificação britânica, entretanto, este trabalhador está em um patamar abaixo dos employees, com contrato de trabalho tradicional.
No Brasil, inexiste este segundo escalão, abaixo dos empregados celetistas e acima dos trabalhadores avulsos ou autônomos. Esta ausência legislativa, mais uma vez, acaba por alocar à cansativa e antiquada discussão de existir ou não uma relação de emprego. Gera-se, com isto, uma insegurança jurídica que se verifica, inclusive, nas divergentes decisões emanadas das Cortes Regionais Trabalhistas, que ora declaram a existência de uma relação de emprego e, a reboque, conferem uma enormidade de direitos e dinheiros àquele trabalhador e ora julgam improcedente a demanda, não conferindo qualquer tipo de amparo aquele postulante.
Home office. Trabalhar em casa. Embora pareça muito atrativo, há ainda diversas lacunas legais que não amparam esta modalidade, ou seja, que não conferem ampla segurança jurídica. O teletrabalho não é novidade no mundo do trabalho, mas foi com a pandemia do novo coronavírus que esse regime de trabalho se disseminou rapidamente. De acordo com o IBGE, cerca de 7,9 milhões de brasileiros se encontravam em teletrabalho no mês de setembro de 2020. E esta forma de trabalho, ainda atualmente, não conta com o resguardo e segurança de uma legislação.
Em que pese existir em nosso ordenamento, desde 2017, com a reforma trabalhista, a regulamentação do teletrabalho (artigo 75 A da CLT), diversos pontos desta regulamentação confere às negociações coletivas o poder de definir as obrigações das partes contraentes. Assim, para as negociações coletivas fica a incumbência de definirem as regras para esta modalidade contratual.
Noutro tanto, pela definição trazida pela própria lei ao teletrabalho, verifica-se que o trabalho híbrido, não está alí abrangido. Assim, a lei não está preparada, passados alguns anos desta situação, para conferir aos agentes ampla segurança jurídica. Não se trata somente de lacunas legais. Temos inúmeros pontos da nossa legislação que é diametralmente oposto aos novos tempos.
Regra do enquadramento sindical um exemplo. Qual seria o território que definirá o enquadramento daquele trabalhador de Recife, que foi contratado para trabalhar para uma empresa sediada em Porto Alegre. Qual a norma coletiva deverá ser respeitada naquele contrato? Houve diversos projetos de lei que se propuseram alterar o artigo 75-A e/ou criar novos regramentos para fazer frente a esta necessidade, quais sejam: PL 4931/2020, PL 4831/2020, PL 3915/2020 (todos em trâmite na Câmara dos Deputados) e PL 3512/2020 (em tramitação no Senado). Nenhum deles, entretanto, foi adiante, ou seja, ainda padecemos de um enorme descompasso entre a legislação vigente e a necessidade das novas formas de trabalho.
Ano sabático é conhecido como o período de 12 meses em que a pessoa se dedica a algum projeto de vida particular, retirando para isso uma licença de suas funções profissionais. E o tal ano sabático, já muito comum nas relações de emprego com as gerações Y ou Millennials e Geração Z, não possui qualquer previsão nas leis trabalhistas brasileiras. Como não existe a possibilidade de se manter um contrato suspenso por um ano, as empresas muitas vezes se veem obrigadas a demitir, ainda que sem vontade, aquele trabalhador, “garantindo” a sua recontratação quando do seu retorno.
De acordo com dados de 2018 da Society for Human Resource Management, que concentra informações sobre práticas e tendências do setor de recursos humanos nos Estados Unidos, apenas 15% das companhias americanas oferecem programas de licença não remunerada a seus empregados. A Lei Brasileira, todavia, não prevê esta situação. A meu sentir, já é hora de viabilizar aos operadores do contrato esta possiblidade. É cada vez mais comum o empregado (jovem ou não) pensar em realizar o tão sonhado ano sabático. A lei, por sua vez, não consegue, ainda, dar guarida a esta situação.
Assim, tem-se, ainda, inúmeras situações de modelos atuais de trabalho que a legislação brasileira se demonstra defasada. A previsão legal que possibilita as negociações entre sindicatos não tem se demonstrado suficiente, muito embora é uma excelente solução. A atuação sindical é tímida. Por sua vez, não poderia a negociação entre entidades sindicais legislar sobre alguns pontos, de modo que, caberá ao governo federal, em algum momento, lançar mão de uma nova reforma trabalhista, a fim de inserir na legislação atual, novas regras capazes de abraçar as novas formas e modelos de relações de trabalho.