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03/01/2023Todas as vítimas, pessoas físicas ou jurídicas, têm direito às reparações a serem pagas pela União
Publicado em 1 de janeiro de 2023, 13:25
Agência Brasil
Responsabilização de agentes públicos pelos prejuízos dos bloqueios de rodovias
por Percival Maricato
Os protestos após à eleição presidencial compreenderam delitos praticados por agentes públicos em face dos bloqueios de rodovias. As evidências que podem constituir provas de práticas lesivas a milhões de pessoas e milhares de empresas estão também na Internet, em matérias na imprensa e, por isso, são objeto de apurações de autoridades dos ministérios públicos estaduais e outros organismos com tais atribuições. Em seu artigo 37, § 6º, a Constituição da República dispõe que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. Referida regra é definida pela doutrina como responsabilidade objetiva da administração pública, na modalidade do risco administrativo. E no caso, “assegurado o direito de regresso”, diz que a União, alguns estados e municípios que nada fizeram para reestabelecer a ordem, forem coniventes ou omissos, e tiverem que indenizar vítimas, têm também não o direito, e sim a obrigação de exigir indenização dos causadores dos prejuízos.
Independente da forma como se qualifique os fatos posteriores a 30/10, são imensos os prejuízos causados pelos bloqueios nas estradas, tanto para o estado brasileiro como para sua população. E feitos com finalidades abertamente políticas e inegavelmente ilegais: suprimir a forma pacífica e democrática de resolvermos nossas diferenças de ideias, impedir o direito de ir e vir. O fim, ao que se informa, era semelhante à invasão do Capitólio nos EUA. Com algo pior: considerando-se o volume de pessoas atingidas, aqui foi muito mais violento. Uma quantidade estimável em milhões de pessoas perdeu compromissos, horas de trabalho, viagens, operações cirúrgicas; empresas e produtores tiveram seus produtos estragados.
Há também que se contar as humilhações, a angústia, o sofrimento moral e físico dos que ficaram “presos! nas estradas, sem alimentos, bebidas, banheiros, onde dormir, exceto amontoadas em carros, amedrontadas, em insegurança. Ou daqueles que as esperavam, pais, filhos, amigos. Milhares tiveram que voltar para o local de onde tinham saído, cancelar planos de negócios, viagens de lazer, para ver a família. Uma falta de humanidade difícil de se aceitar que passe impune. Mesmo a maioria dos caminhoneiros, inclusive empresas de transportes, que queriam trabalhar, que precisavam entregar mercadorias, foram impedidas de transitar, mesmo após mensagens de suas entidades e lideranças históricas da categoria. Quem era contra a “meia dúzia” que iniciava o fechamento de uma estrada era objeto de agressão.
Todas as vítimas, pessoas físicas ou jurídicas, têm direito às reparações a serem pagas pela União, apelando-se ao judiciário.
Pela União, porque seus agentes, especialmente a Polícia Rodoviária Federal, como se viu em diversos vídeos, demonstram diversos grau de cumplicidade com os atos. Pode-se ver que policiais não eram nem mesmo omissos, declaravam que a determinação era estar junto com os infratores, sem tomar qualquer providência para reestabelecer a ordem pública. Nem podia ser diferente, tendo em vista a nomeação do dirigente máximo do órgão, seus antecedentes, suas declarações de apoio ao candidato defendido pelos autores dos bloqueios, pela operação no dia das eleições dificultando a circulação de ônibus em estados do Nordeste. A obrigação do órgão, pela lei, e isso terminaria logo com o bloqueio, era prender os infratores em flagrante delito, abrir inquéritos, apreender carteiras de habilitação, apreender e retirar a força os veículos que insistissem em interromper o trânsito, multar com rigor. A Procuradoria Geral da República, comandada por Augusto Aras, se calou o tempo todo e só veio a fazer tímidas declarações a favor da lei após o pronunciamento do Presidente Bolsonaro, condenando o bloqueio (este por sua vez pressionado por entidades patronais que o apoiaram abertamente, mas estavam tendo violentos prejuízos).
A indenização também pode ser pleiteada aos estados da Federação, no caso de ter ocorrido em estradas estaduais, sem que nenhuma providência fosse tomada. Pode, mesmo no caso das estradas federais, se o governador se recusou a usar a polícia militar, mesmo após autorizado pelo Ministro Alexandre de Morais, e se deixou de aplicar multas demonstrando que estava contra o bloqueio..
Tanto por seus prejuízos diretos, como pelos que tiver por responder a ações de indenização, ou ressarcimento dos prejuízos, cabe à União identificar e pedir ressarcimento aos que provocaram o tumulto. As indenizações e despesas que teve a União sairão dos bolsos de todos os brasileiros. O Ministério Público Federal, tão logo mude o Procurador Geral, assim como os dos estados, podem pensar em ações coletivas para reparação de direitos difusos contra todos que participaram dos atos ilícitos, principalmente empresas.
Isso significa processar as empresas proprietárias dos caminhões que bloquearam as estradas. Estas transportadoras também podem ser processadas pelas pessoas que foram impedidas de seguir viagem com base no artigo 927 do Código Civil, onde está dito que “aquele que, por ato ilícito causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.” Reparação integral, danos materiais e morais.
Enfim, o delito não pode ficar como da última vez, tempo em que Temer foi presidente, sem punição, sob pena de o vermos repetido cada vez que fatos ou leis descontentarem os mesmos grupos.
Além disso, tornou-se premente que se aprovem leis e penalidades específicas para esse tipo de delito, tanto para os que o cometem como para os que são cúmplices, como autoridades que cruzam os braços.
Percival Maricato, advogado, sócio de Maricato Advogados