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09/03/2023Valor Investe| Especialistas pedem mudanças na legislação após caso Lojas Americanas
09/03/2023Segundo advogados em direito empresarial, a lei em vigor não distingue gestão fraudulenta de crise comum
Especialistas do ramo jurídico afirmam que o caso da Americanas mostra as limitações da legislação atual para a área, que pouco distingue crises comuns de empresas em dificuldades financeiras causadas por gestões fraudulentas.
Segundo advogados e juristas especializados em direito empresarial, há dificuldades em separar a responsabilidade de maus administradores e controladores da atuação dos funcionários. Eles também citam a falta de mecanismos eficientes para proteger acionistas minoritários e pequenos fornecedores.
O advogado Alcides Wilhelm, mestre em direito empresarial e cidadania, diz que o caso da Americanas se tornou uma exceção entre os processos de recuperação judicial.
“Em tese, a recuperação judicial é um processo onde os credores são chamados a ajudar a empresa no reerguimento. O caso das Americanas acaba sendo sui generis, uma exceção. A gente ainda não pode afirmar 100%, mas tudo indica que a empresa entrou em dificuldade mediante fraudes, com demonstrações contábeis que não espelhavam a realidade. Isso é diferente de uma empresa em crise por causa da disparada do dólar ou de decisões erradas de negócios”, diz Wilhelm.
O advogado defende mudanças na legislação para que, em caso de fraude comprovada, os administradores ou controladores sejam responsabilizados como pessoas físicas, com a empresa mantendo as atividades. “Precisaríamos ter uma legislação que punisse os maus empresários, em vez da empresa”, destaca.
“Nesses casos, o dono seria afastado da administração, perderia o controle dela, o Judiciário colocaria um administrador judicial para continuar as operações e pôr a companhia à venda. Ela cobre todos os prejuízos que causou. Se sobrar dinheiro, o ex-proprietário recebe. Seria uma forma de punir os maus empresários com a perda do negócio”, explica.
Segundo Wilhelm, se essas mudanças valessem, as empreiteiras investigadas pela operação Lava Jato teriam as atividades preservadas, com apenas os executivos sendo punidos e milhares de empregos sendo preservados. “A Americanas são uma empresa grande, com importante função social. A separação entre as pessoas físicas que cometeram irregularidades e a empresa seria o ideal para preservar as atividades”, avalia.
Minoritários
O advogado Renato Scardoa, jurista que participou da elaboração da nova Lei de Falências, considera necessária a reformulação da legislação societária. Segundo ele, as mudanças devem conceder mais direitos a acionistas minoritários, afetados pela gestão dos administradores e controladores.
“Hoje, a gente não tem uma ferramenta mais célere e efetiva para que os acionistas minoritários possam processar administradores que ajam de maneira indevida. É muito difícil um acionista minoritário responsabilizar uma conduta indevida dos administradores. O ideal é uma ferramenta que facilite uma ação coletiva dos acionistas minoritários contra os administradores. E, havendo uma participação ou omissão indevida dos controladores, também contra os controladores”, explica.
Em relação a fornecedores, Scardoa diz que a nova Lei de Falências suprimiu um artigo que dava prioridade a micro e pequenas empresas no recebimento de créditos dentro da classe de credores composta por empresas.
Divergências
Apesar da necessidade de mudanças na legislação, os especialistas divergem sobre como ela se daria. Wilhelm defende a separação entre a atuação de executivos, diretores e controladores do restante da empresa.
“Nos meios doutrinários, começou-se a questionar se o instituto da recuperação é para uma empresa que possa ter cometido um crime ou uma fraude em relação a seus credores ou se a falência deveria ser buscada diretamente nesses casos, com a venda da companhia para terceiros”, disse.
Scardoa não concorda com uma reformulação da Lei de Falências. Para ele, o principal problema não está na legislação atual, mas no fato de que as Lojas Americanas têm o controle pulverizado, nas mãos de muitos acionistas em vez de poucos donos. “As respostas nesse caso estão na legislação. Na verdade, o que poderíamos encontrar seria talvez uma alteração na legislação societária, para que os acionistas minoritários processem os controladores e os administradores, e não necessariamente mexer na recuperação judicial”, diz.
Com informações da Agência Brasil.