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13/03/2012Gestor do maior fundo multimercado do País fala sobre o alto endividamento global e diz que tem vendido ações e apostado em câmbio
Se os marcianos fossem comprar a Terra, o que fariam?”, pergunta Luis Stuhlberger para a pequena e selecionada plateia de investidores e economistas. “Eles pagariam pelos recursos naturais e pelo conhecimento humano, que são bens importantes. Mas certamente não pagariam nada pelo dinheiro do planeta, porque o que existe em endividamento é maior do que em ativos”, diz. A parábola ilustra uma conhecida conta-que-não-fecha do sistema financeiro, que o gestor do maior fundo multimercado brasileiro acredita ser o gatilho do próximo colapso global.
Se o dinheiro não valeria nada para um marciano, um dia ele sofrerá o ajuste e valerá menos para terráqueos. Isso é causado, segundo Stuhlberger, porque a quantidade de dinheiro sobrando na mão de poucos é imensa – assim como é imensa a dívida de empresas e governos. “Na próxima crise, o que vai perder valor será o dinheiro. O dólar e o euro vão perder valor, quem tem ações vai perder menos. Um por cento de pessoas detém 99% do spare money [dinheiro ocioso] do planeta, e quem tem muito dinheiro vai perder”, diz Stuhlberger. “Mas isso é daqui a dez anos, e o mundo nunca acaba.”
Se a próxima crise vier, talvez o menos afetado seja o próprio Stuhlberger, que ganhou dinheiro em todas as últimas grandes turbulências econômicas – ou “desequilíbrios”, como diz. Entre janeiro de 1997 e fevereiro de 2012, o Fundo Verde – o maior multimercados do Brasil, criado por ele – teve alta média anual de 31,8% acima do CDI. No mesmo período, a valorização do Ibovespa foi 1,1% menor que o CDI (taxa de juros de referência no mercado). No auge da última crise, entre outubro e dezembro de 2008, Stuhlberger teve lucros de 8% investindo no mercado do qual todos estavam correndo – as ações.
No final de 2006, ele e seus três sócios na Hedging-Griffo (no momento do negócio, Stuhlberger tornou-se majoritário, com 20% de participação) venderam 51% da empresa ao Credit Suisse, por R$ 635 milhões. A operação criou a Credit Suisse Hedging-Griffo, onde está agora o Fundo Verde, com mais de R$ 15 bilhões sob gestão. Stuhlberger é gestor do fundo e responsável pela área de asset management (ou administração de ativos) da CSHG, que administra cerca de R$ 30 bilhões.
Acostumado a ser chamado de “visionário” e “brilhante” pelos pares do mercado, Stuhlberger, 57 anos, não dá muitas palestras ou entrevistas. Antes do curso da noite de segunda-feira (12), na Casa do Saber (São Paulo), foi apresentado por Florian Bartunek, ex-diretor do banco Pactual e sócio da Constellation Assets, como um “orgulho nacional”, por figurar entre “os maiores gestores de fundos hedge [multimercado] do mundo”.
A valorização de seus ativos, ao longo dos anos, foi construída porque Stuhlberger antecipou grandes ajustes macroeconômicos – quando ganhou com mudanças bruscas de câmbio e juros – e apostas em ações, notadamente de bancos, telecomunicações, mineração e petróleo. As ações sempre tiveram peso de aproximadamente um terço dos investimentos, enquanto os outros dois terços ficam em renda fixa. Os papéis que mais renderam, no balanço da história do Fundo Verde, foram Petrobras, Banco do Brasil, Itaú, Vale e Telebrás. E duas empresas – Souza Cruz e Lojas Americanas – são lembradas por ele como grandes oportunidades perdidas. “Se tivesse colocado todo dinheirona SouzaCruz desde o começo, tinha ganhado mais”, diz.
Na palestra, Stuhlberger comentou questões de conjuntura, como as variações de câmbio e a queda de juros, que, tudo indica, deve continuar. “Baixar juros ou desvalorizar o real não resolve o problema de competitividade da indústria. Se não fizemos a lição de casa, se não fizemos nenhuma reforma, combater a consequência fica difícil. Nosso estoque de mão de obra para a indústria está acabando, e aquele que pode substitui-lo precisaria de muito tempo para se qualificar. Os setores muito ‘mão de obra intensivos’ vão passar por um ‘bad time’ [tempos difíceis] na bolsa”, diz. “A indústria perde competitividade de maneira galopante, está começando a perder para os vizinhos da América Latina”.
Stuhlberger se notabilizou pela capacidade de perceber um ativo barato, mesmo quando ninguém no mercado liga para aquele papel. É um faro que fez o gestor acumular histórias de ganhos meteóricos. No momento, ele vê oportunidades de lucros em títulos de bancos e empresas brasileiras. Também acredita que o dólar próximo a R$ 1,70 esteja “num belo ponto para a compra” (embora, nos últimos pregões, o preço da moeda tenha se aproximado de R$ 1,80).
“Nesse ano, estou mais vendendo ações e comprando contratos de câmbio”, revela o investidor. “Mas acredito que, nos próximos 90 ou 120 dias, deve haver um boom na bolsa, porque muita gente vai sair da renda fixa [que perde rentabilidade com a queda nos juros] e migrar para a renda variável”, diz Stuhlberger.
O gestor também acredita que o câmbio seja a melhor maneira de se proteger de um eventual colapso do euro, que acredita ser um risco real. “O ideal é [usar euros para] comprar um cesto de moedas de Cingapura, Taiwan e Malásia, que são meus países favoritos na Ásia. Mas isso não é para ganhar dinheiro, é para perder menos”, afirma.
Prever desequilíbrios e descobrir ativos baratos, claro, não é dom corriqueiro. Mas o gestor dá uma pista daquilo que pode ser a receita. “O foco do meu trabalho é ler e tirar conclusões. Faço isso com o máximo de concentração, normalmenteem casa. Abusca por desequilíbrios é uma coisa permanente”, diz.