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Moreau Advogados
Veiculado na Revista Das Artes
20/02/2016
Proteção Cultural
Por Pierre Moreau, especialista em direito aplicado à Arte e sócio do Moreau Advogados
A criação de uma obra de arte é uma fusão de elementos que promovem emoção aos sentidos. Uma obra não só enriquece o cenário artístico, mas também toda a humanidade. É que a Arte reflete história, cultura, traços de uma civilização, ou seja, a Arte reflete identidade e memória, pois é uma constante releitura feita pelo passado, presente e futuro, e desta forma, as obras, principalmente aquelas consideradas como bens culturais, devem ser garantidas e protegidas.
Para tanto, instrumentos legais foram criados. Podemos citar a criação de Leis internacionais que proíbem a destruição da propriedade cultural, como a Convenção de Haia, que é responsável por enriquecer a legislação da proteção da propriedade cultural mundial por meio de seus protocolos e estatutos, e a formação de organizações como a UNESCO, que tem a responsabilidade de monitorar e ajudar a preservação da propriedade cultural. Contudo, mesmo diante destas políticas e legislações de proteção ao patrimônio cultural ainda nos vemos ameaçados por perdas culturais.
Vale lembrar que estes ataques culturais vêm ocorrendo de forma frequente ao longo dos anos. No começo do Século XX, por exemplo, a coleção de arte da cidade proibida na China foi transferida para Taiwan pelo líder nacionalista Chiang Kai-Shek, como um esforço de salva-la da destruição causada pela guerra, primeiro pelas forças armadas japonesas, e depois pela guerra civil chinesa. Chiang Kai Shek recuou-se em Taiwan, deixando Mao Tse Tung no controle do comunismo no continente, e assim levou consigo inúmeras obras de arte da antiguidade chinesa. A coleção foi futuramente exposta no Museu do Palácio Nacional, aberto em Taipei em 1965, ao mesmo tempo em que a Revolução Cultural Chinesa estava em ebulição no continente, onde milhares de obras chinesas foram destruídas. Tal ato é considerado controverso. Enquanto muitos Taiwaneses acreditam que os tesouros artísticos chineses foram salvos da guerra, chineses consideram a ação como furto, pois atualmente o Museu do Palácio Nacional de Taipei é considerado como um dos maiores dos que abrigam antiguidades chinesas, independentemente de proteger o patrimônio cultural de uma nação.
Nos dias atuais citamos o vandalismo cultural conduzido pelo ISIS o qual fomos expostos recentemente. Com o objetivo de uma “limpeza” cultual, o grupo extremista tem causado não só a destruições de obras, como por exemplo, a da estátua do Rei de Hatra, mas também a propagação de saques de artefatos considerados históricos, o qual gera depois do petróleo a segunda maior fonte de recursos do grupo, arrecadando cerca de 10 milhões de dólares por ano. Para combater essa pratica o conselho de segurança da ONU apresentou uma resolução que bane a venda de antiguidades vindas da Syria, e os governos dos Estados Unidos e de alguns países da Europa reforçaram leis que combatem o contrabando. Contudo, tais medidas são insuficientes para frear o mercado negro, haja vista que a maioria das obras de arte de alto valor são vendidas diretamente a compradores privados e não por intermédio de um agente.
Disposições, como as da Unesco, que expõem medidas e condutas legais que garantam a proteção do patrimônio histórico da humanidade estão começando a serem observadas com mais atenção depois destes ataques. Tanto é assim que o presidente francês, François Hollande, após os ataques cometidos em Paris no dia 13/11/2015, discursou na Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação e Cultura) no dia 17/11/2015, que a herança cultural deve ser protegida do terrorismo. O presidente disse que 70 bilhões de euros (R$ 283 bilhões) foram destinados para resguardar a herança cultural da Idade Média e ainda propôs a criação de um fundo internacional que permita ajudar a preservar as construções artísticas que podem ser alvos de ataques. A ONU por sua vez também aprovou recentemente uma medida em que dispõe que as tropas de paz irão proteger sítios localizados em zonas de guerra ou que estão ameaçados por ataques de grupos extremistas.
O processo de globalização influencia todos os aspectos da vida humana. Desta forma, com o aumento das conferências internacionais, Governos, organizações não-governamentais e, também, a própria comunidade internacional reconhecem, valorizam e preservam o patrimônio cultural de forma mais ativa ao levantarem questionamentos sobre o atual cenário mundial, pressionando assim Poderes Públicos locais a dispor de instrumentos legais para tanto, como por exemplo o estabelecimento de acordos transnacionais ou convenções que estipulam os tipos, categorias, o regime de proteção, o uso do patrimônio cultural, direitos e obrigações dos signatários, etc.
Assim, esse processo de aprofundamento internacional das relações econômicas, sociais, políticas e culturais, combinado com a promoção de políticas públicas pode por fim despertar e promover a valorização da cultura mundial, assegurando sua devida proteção legal e o tratamento que lhe é devido, resguardando o sentimento de pertencimento a um lugar, a um povo, a uma história, a qual nunca será esquecida.