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21/12/201819 Dezembro 2018 | Estadão
O direito penal econômico parece ser um ramo em constante expansão no Brasil. A real efetividade da persecução penal de atividades financeiras não se encontra suficientemente comprovada, o que não se pode dizer, no entanto, dos prejuízos econômicos causados pela massiva divulgação midiática dessas investigações policiais – com citação explícita dos nomes de “envolvidos” -, como ocorreu em diversas das fases da Operação Lava Jato.
A isso, soma-se um sistema híbrido de sancionamento penal e administrativo, o qual deixa clara a irracionalidade tanto da produção legislativa no setor – com o uso exacerbado de tipos abertos e normas penais em branco -, quanto da política sancionatória empregada, a qual se apresenta descontínua em algumas condutas e duplicada em outras, acarretando, muitas vezes, o famigerado bis in idem, que diz respeito à repetição de sanção sobre o mesmo fato.
Não é outro o cenário que se observa no ramo do direito concorrencial, que é bastante recente no que tange ao complexo de condutas hoje abrangidas pelo direito penal dito econômico e empresarial. O próprio pertencimento desse ramo jurídico ao direito penal é questionado, havendo autores que entendem ser este mais adequado ao direito administrativo. As condutas tipificadas se encontram espalhadas na legislação penal extravagante, podendo-se destacar o artigo 4.º, da Lei n. 8.137/90, bem como crimes previstos nas Leis n. 9.279/96 e n.º 8.666/93.
O encontro das esferas penal e administrativa fica ainda mais evidente com a disposição constante no artigo 87, da Lei 12.529/2011, a qual estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Nesse dispositivo estão previstas as consequências penais do chamado acordo de leniência, regulado pelo artigo 86 da mesma lei, as quais incluem a suspensão da prescrição penal e o impedimento do oferecimento da denúncia. A ausência de previsão legal de participação do Ministério Público e do Judiciário no referido acordo, que tem seu cumprimento verificado por autoridade administrativa (Cade), vulnera a segurança jurídica e os direitos de acusado, não se podendo supri-la pelo mero chamamento de representantes do MP para a assinatura do termo. Nesse sentido, destaque-se a manifestação jurídica de Gustavo Alves Magalhães: A autorização para que se concentre sobre o âmbito executivo competência para dirimir ato que transcende sua esfera de domínio representa interferência atípica em seara diversa, não amparada pela Constituição e transgressora à independência funcional entre esses poderes. Sua permissão ainda constitui insegurança aos direitos e garantias dos signatários do acordo, visto que não lhes garante a vedação ao posterior uso das informações prestadas em processo judicial contra eles. Assim, a omissão da lei, uma vez mais, revela ofensa constitucional que precisa ser sanada para possibilitar a conformação do instituto à realidade brasileira.
A construção de um direito penal empresarial efetivo, mas, concomitantemente, constitucionalizado, passa por uma reformulação da política sancionatória estabelecida, sendo necessário um pensamento conjunto do direito penal e do direito administrativo incidentes nessa seara. O direito da concorrência é apenas mais um caso que demonstra que há muito a ser discutido e modificado no setor.
Poder-se-ia iniciar, por exemplo, com uma maior incidência do direito de defesa no processo administrativo, o que incentivaria o movimento pela descriminalização de uma série de condutas que seriam melhor tuteladas por outro ramo do direito que não o penal. Tal medida auxiliaria na concretização do princípio da ultima ratio, típico de um direito penal subsidiário e fragmentário como deve ser o do Estado Democrático de Direito.
*Chiavelli Falavigno, sócia do Franco Advogados
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