Ou seja, Hasselmann assina uma obra baseada em coleta de dados e análise de documentação que não passou por seu crivo. “Delatores” trata de um tema delicadíssimo, com implicações judiciais: as informações prestados por colaboradores premiados no âmbito da Operação Lava Jato.
A história veio à tona em decorrência de um processo movido contra Hasselmann por Hermes Freitas Magnus, um dos delatores citados no livro. Magnus, empresário que denunciou um esquema do falecido deputado José Janene na Petrobras, reclama de “inverdades” contidas no livro.
Na ação judicial, o empresário apresenta documentos que mostram como as tratativas sobre o material publicado se deram entre ele e o escritor contratado, que teria tentado fazer com que Hasselmann corrigisse as informações imperfeitas antes da publicação, sem sucesso.
A deputada eleita nega as acusações e garante que apurou as informações e escreveu a obra sem auxílio de ninguém. “Meu livro é meu. Não tem nada de ‘ghost’. Isso é pilantragem”. Magnus, afirma, é um “aproveitador em busca de holofotes e dinheiro.”
O jornalista apontado como ghostwriter disse a CartaCapital que, por força de contrato de confidencialidade, não irá se pronunciar sobre o tema. A editora não respondeu às ligações até a publicação desta reportagem.
Entenda o caso
Magnus, proprietário da Dunel Indústria e Comércio, figura na Operação Lava a Jato como um denunciante que revelou, em 2014, a existência de um esquema de lavagem de dinheiro posto em prática por Janene, então um dos próceres do PP.
No livro “Delatores. A ascensão e a queda dos investigados na Lava Jato”, assinado por Hasselmann, Magnus figura como participante dos esquemas investigados, tendo se tornado delator premiado posteriormente. Ou assim seria registrado o episódio nas páginasa. É que, antes do lançamento do livro, no início do ano passado, a jornalista e a editora promoveram o livro. Em uma das propagandas, havia um trecho com afirmações consideradas falsas pelo empresário.
Magnus decidiu então entrar em contato com a autora do livro e a editora. E soube que “Delatores” não havia sido escrito por Hasselmann, mas pelo ghostwritter. Diante da informação, o empresário passou a pleitear do jornalista contratado para fazer o trabalho pela futura deputada que alterasse o termo “delator” por “denunciante”. O pedido foi atendido.
Não satisfeito, Magnus solicita a mudança na propaganda do livro circulava pela internet. O jornalista contratado informa, porém, que a alteração está fora de seu alcance. Tudo isso consta em conversas pelo aplicativo Whatsapp, cuja reprodução fotográfica consta no processo judicial movido contra Hasselmann e também abaixo.
Sem ter os pedidos atendidos, o empresário decidiu escrever diretamente para a editora, para Hasselmann e para o ghostwriter:
Magnus pede na Justiça uma indenização de 2 milhões de reais. A deputada eleita ainda não se manifestou no processo, mas gravou um vídeo em que exibe a sua contrariedade por estar sendo acionada judicialmente. “Vá pro raio que te carregue e leve todos esses vagabundos aí que estão envolvidos na Lava Jato com você. Vai pedir pro Geddel 2 milhões sem vergonha. Pilantra de quinta categoria.” Sobre ter ou não contratado um ghostwritter, a “autora” do livro não se pronunciou.
A advogada Ana Júlia Moraes, sócia das áreas de Resolução de Disputas e Arbitragem de W Faria Advogados, explica que não há qualquer tipo de crime na prática de se contratar um ghostwritter. O problema não seria, portanto, jurídico, mas apenas de natureza ética, ainda mais quando alguém se apropria da fa fama por ter escrito um livro investigativo, one afirma ter apurado e desvendado questões ligadas a uma das maiores operações policiais do Brasil.
“Não há ilegalidade na formalização de um contrato de terceirização de obra literária, desde que as vontades das partes envolvidas estejam livremente pactuadas e sejam respeitadas”, explica a jurista. “Se o real autor da obra consente em não aparecer ao grande público, não tem nada de ilegal”, conclui.
Outros casos de Joice: plágio e uso indevido da marca
Joice Hasselmann tem em sua carreira outro caso envolvendo apropriação intelectual de trabalho feito por outros jornalistas. Ele veio à tona em 2015, quando o Sindicato dos Jornalistas do Paraná reuniu mais de 60 reportagens que ele havia reproduzido em seu blog pessoal que tinham sido escritas por outros jornalistas do Estado. O resultado da apuração do sindicato pode ser visto aqui.
Ela foi denunciada por 23 jornalistas que tiveram seus textos copiados. Ainda assim, jamais assumiu a responsabilidade pela apropriação das reportagens. Em sua conta de Facebook, afirmou: “Lamentavelmente o meu novo auxiliar não seguiu as minhas orientações básicas de dar crédito às matérias de outros veículos e estou tendo esses problemas”. A culpa, era, portanto, do estagiário.
Atualmente, a deputada eleita sofre ainda um outro processo, desta vez por uso indevido da marca, movido pela revista Veja e pela Editora Abril. Seu número: 1038197-42.2016.8.26.0100
Joice foi funcionária da publicação, e lá apresentava um jornal via internet. De acordo com a Editora Abril, que já venceu op processo em primeira instância e aguarda agora que a apelação de Joice seja julgada, mesmo após ter sido demitida pela revista, a jornalista continuou tentando fazer parecer que ainda trabalhava para a Veja. Para tanto, fez uso do nome “Veja Joice”para seu programa na internet e também de uma linguagem visual muito próxima da que existia no jornal apresentado por ela na Abril. A jornalista nega, afirma ser mera coincidência.
Veja as imagens dos dois jornais de internet, aquele em que ela apresentava na revista e, abaixo, o que passou a apresentar em site independente. Os comentários nas imagens são dos advogados da Editora Abril.
Leia na Carta Capital, aqui.