Resultados da transação tributária do
17/03/2020Covid-19 faz PGFN suspender cobranças e facilitar
20/03/2020teste de covid-19 às operadoras de planos de saúde
Fernando Bianchi*
19 de março de 2020 | 04h50
Com a pandemia do coronavírus declarada pela OMS – Organização Mundial da Saúde –, não demorou para que se passasse a sustentar que a responsabilidade pelos custos do respectivo teste para sua detecção fosse imputado às operadoras de planos de saúde.
Não obstante o clamor público da situação, sob uma análise técnica, tal obrigação de cobertura não deveria existir.
Historicamente, tanto antes como após a Lei dos Planos de Saúde – Lei n. 9.656/98 –, situações de epidemias, pandemias, cataclismas, desastres naturais e congêneres sempre foram cláusulas de exclusão de coberturas dos planos de saúde.
Ademais, medidas de saúde pública jamais foram de responsabilidade direta das operadoras privadas, tanto que campanhas de combate a outras epidemias, como o fornecimento de vacinas à população, não têm cobertura imputada aos planos de saúde.
Até porque, diferentemente do que ocorre em outros países, conforme previsão constitucional, o Estado Brasileiro tem a obrigação de prestação de saúde integral.
Portanto, em verdade, a obrigação de custeio dos testes de detecção do coronavírus deveria recair, exclusivamente, sobre o Estado e não sobre os planos de saúde privados.
Importante destacar que a própria Lei nº 13.979/20, que trata das medidas de enfrentamento do surto do coronavírus, prevê em seu art. 3º. §2º., II o direito do paciente de receber tratamento gratuito a ser prestado pelo estado. Logo, as operadoras não deveriam ser instadas a arcarem com tal custo.
Já a Portaria do MS nº 356 de 11.3.20, que regulamenta a Lei nº 13.979/20, em seu artigo 8º. dispõe expressamente que os exames de diagnóstico do coronavírus realizados em laboratórios privados, devem ser validados por laboratórios de referência nacional. Tal previsão implica na ausência de utilidade na imposição às operadoras de planos de saúde, de prestarem cobertura dos custos do exame junto a sua rede privada de laboratórios, considerando que tal análise deveria ser feita diretamente pelos laboratórios de referência nacional indicados na citada legislação as custas do Estado.
Importante lembrar que nem mesmo a figura do ressarcimento ao SUS se aplicaria ao caso, já que não há previsão de cobertura contratual nos contratos de plano de saúde para tal exame.
Por outro prisma, em recente decisão do STJ, restou pacificada a natureza taxativa do rol de procedimento da ANS, ou seja, a não obrigatoriedade de cobertura de procedimentos que não tenham expressa previsão.
A adoção de medidas circunstanciais no âmbito regulatório, como por exemplo, a criação de DUT – Diretrizes de Utilização – sobre cobertura de procedimento inexistente ou antecipação de atualização do rol de procedimentos obrigatórios da ANS, feita pela RN/ANS nº 453, que a rigor ocorre a cada dois anos, fere princípios legais.
Outra questão relevante é a reação da grande massa populacional diante de situações de epidemias. Se forma um desespero geral que, sob a garantia de ausência de custo para o beneficiário do plano, provoca utilização desenfreada e sem efetiva necessidade ou correta indicação médica, congestionando os centros diagnósticos e provocando colapso e deficiência dos recursos para os casos com efetiva indicação.
O desiquilíbrio da equação econômica financeira do contrato de planos de saúde será uma realidade, pois com pouca oferta e grande demanda os respectivos custos dos referidos testes serão inflacionados, causando grande abalo na capacidade assistencial para os demais usuários do sistema de saúde privada.
Não é razoável impor mais essa obrigação não contemplada nos cálculos atuariais, que lastreiam os preços dos contratos de planos de saúde, para atender uma necessidade circunstancial, sob pena de abalo do sistema de assistência privada como um todo.
Portanto, cabe ao Estado editar e fiscalizar protocolos de correta elegibilidade para a realização dos referidos testes, bem como arcar com os custos de sua operacionalização.
*Fernando Bianchi, advogado especialista em Direito Médico e da Saúde, sócio da Miglioli e Bianchi Advogados e ex-membro das Comissões de Direito Médico e de Planos de Saúde – OAB/SP
Leia no Blog do Fausto Macedo do Estadão, aqui.