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21/08/2020Do Diário do Grande ABC
21/08/2020 | 23:59
Não está sob nosso controle a forma como reagimos sentimentalmente à vivência de isolamento físico imposto. Porém, certas características individuais como temperamento, idade, capacidade individual para se adaptar a situações desconhecidas e criação de novas rotinas, nível de segurança sobre a própria identidade e firmeza na autodeterminação, entre outras propriedades, podem diminuir ou aumentar a intensidade da sensação de estresse.
O contexto onde o isolamento se desenvolve pode também afetar sobremaneira o manejo satisfatório do desconhecido. Percepção de conforto material e emocional, na possibilidade de se dividir o isolamento com quem se gosta e onde e na forma que se quer, pode estar mais relacionado à ideia de um sonho do que a ambiente propício ao adoecimento. Neste sentido, o nível social e o conforto a ele relacionado, junto com as fragilidades ou recursos individuais, influenciam o nível de pressão sobre nossa saúde mental.
Se a pessoa é tímida ou tem dificuldade na convivência com pessoas, isolamento pode não exigir nada ou algo pouco diferente do que já era praticado diariamente. Idoso que já vive isolado da sociedade, pouco saindo, também não é fortemente afetado pelas mudanças ocasionadas pela quarentena. No entanto, para aqueles que têm seu convívio familiar interrompido pelo isolamento, sofrem mais e podem, inclusive, desenvolver sintomas psíquicos, mesmo que esse isolamento tenha sido causado por bons motivos de proteção. Pessoas compulsivas por esporte, trabalho, compras, terão que se confrontar com abstinência durante o isolamento. Nesta direção, nenhuma patologia mental seria criada, mas evidenciada.
Na prática, situações vividas como estressantes podem ser traumáticas, seja por desconhecimento dos atributos da nova realidade, pela perda de rotina que poderia nem ser satisfatória, mas que era conhecida, ou pela indefinição de parâmetros que poderiam dar luz ao caminho a ser seguido na busca pela saída da reclusão. O contexto do adoecimento é aquele determinado por reação de defesa do tipo luta ou fuga. Onde incômodo e clima de alerta constante reforçariam em nós mais de nós mesmos.
Uma pessoa que costuma reagir emocionalmente com características ansiosas poderá adoecer de ansiedade, ou pessoa que reage com tristeza poderá, com o estímulo traumático, desenvolver depressão. Uma pessoa que luta contra solidão pode se sentir condenada a estado que procura combater, desesperando-se. Resumindo, o estresse criado pelo isolamento e suas variáveis revelam nossas fragilidades na tentativa de enfrentamento. O adoecimento decorre desta falência.
Cirilo Tissot é médico psiquiatra, diretor técnico da Clínica Greenwood e terapeuta familiar.
https://www.dgabc.com.br/Noticia/3527050/pandemia-sofrimento-e-adoecimento