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PNBE – Pensamento Nacional das Bases Empresariais
Veiculado no Portal Jota Info
16/05/2016
Em palestra sobre reforma política, Barroso defende um “presidencialismo atenuado”
Por Luís Viviani
São Paulo
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso palestrou, nesta segunda-feira (16/5), em São Paulo, sobre dificuldades do sistema político brasileiro e possíveis alternativas para aperfeiçoá-lo. Para o ministro, o atual sistema tem como regra um fisiologismo devastador, que, além de reprimir o que as pessoas têm de bom, potencializa o que têm de ruim.
“Os políticos são recrutados na sociedade brasileira, no mesmo ambiente em que são recrutados os policiais, juízes, membros do MP, pessoas que atuam de maneira geral. E a verdade é que todas as pessoas trazem em si o bem e o mal. Mas, enquanto o processo civilizatório faz reprimir o mal e potencializar o bem, o sistema político está fazendo o contrário”, disse Barroso, logo na abertura de seu discurso.
Durante a palestra, o ministro apontou uma mudança que, em sua opinião, traria efeitos benéficos para a política brasileira: a adoção de um “presidencialismo atenuado ou um semi-presidencialismo”. Por esse modelo, o presidente eleito continuaria com suas competências, “mas o varejo da política seria conduzido por um primeiro ministro, que precisa de lastro político no Congresso”. Para Barroso, “é hora de experimentarmos algo diferente. Uma forma de superarmos esse hiper-presidencialismo”.
O ministro fez uma palestra no Teatro Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado), no bairro da Liberdade, em São Paulo, sobre “Reforma Política e as alternativas para aprimorar a democracia no país”. O evento foi organizado pelo Pensamento Nacional das Bases Empresariais (PNBE) e pela própria Fecap.
Democracia constitucional
“Semanas depois da eleição, os eleitores já não lembram mais em quem votaram. Não se sentem representados”, disse Barroso, para quem a política se transformou num “balcão de negócios com sistema pluripartidário”, um “negócio para obter receitas”.
Professor constitucionalista, Barroso tratou da importância que a democracia constitucional teve no século XX, derrotando projetos fundamentalistas, e que, no Brasil, ela se tornou vitoriosa com atraso – apenas no final do século.
“Nesse momento de angústia e aflição por que passa o Brasil, é preciso lembrar que os 30 anos de poder civil e 27 de Constituição trouxeram conquistas relevantes. Temos 30 anos de estabilidade em um país acostumado com golpes. Desde que D. Pedro dissolveu a primeira Assembleia Constituinte”, disse.
Equilíbrio monetário, expressiva inclusão social de aproximadamente 30 milhões de pessoas que deixaram faixa na miséria extrema foram alguns dos pontos lembrados pelo ministro. “Só quem não soube a sombra é que não reconhece a luz”, acrescentou.
Barroso explicou que a democracia tem três grandes elementos: votos, direitos e razões. No entanto, acredita que é necessário modificar a primeira dimensão da democracia, ou seja, a representativa. “Ela não funciona inteiramente a contento no Brasil. As pessoas não se sentem mais representadas e a legitimidade diminui. No Brasil, as pessoas só têm pregado para convertidos ou para si próprio. Não há diálogo”.
O ministro apontou duas razões para o imobilismo que atinge a política nacional: a complexidade das relações no poder e o fato de que a mudança efetiva do sistema depende da iniciativa e da atuação de pessoas que chegaram onde estão justamente por esse sistema.
“É muito difícil aos donos do poder mudar isso. A reforma política vai sendo postergada porque quem chegou, ganhou dentro desse sistema, jogando esse jogo”, diz.
De acordo com Barroso, a persistência desses problemas trouxeram consequências graves, o que acabou resultando num “descolamento da classe política com a sociedade civil”.
“A política passa a ser um mundo à parte. Distanciado do cidadão, das verdadeiras demandas. O cidadão passa a tratar a política com indiferença, até desprezo. E aí mora o perigo: não se constrói nada sem política”.
Três objetivos
Em sua palestra, o ministro resumiu, como foco das mudanças, que o país precisa enfrentar três objetivos: aumentar a legitimidade democrática do sistema político (“imperativo que o eleitor se sinta representado e queira cobrar”), baratear o custo das eleições para reduzir a centralidade do dinheiro (“para evitar financiamento eleitoral e casos de corrupção”) e diminuir o número de partidos.
Além disso, comentou o fato de que a reforma deve vir através da mudança no sistema de governo – tanto no eleitoral, quanto no partidário.
“Nosso sistema é uma usina de problemas. Com voto proporcional, lista aberta e coligações. Nada podia funcionar pior”, critica. Segundo Barroso, o que acontece de fato no modelo brasileiro, é que o sistema leva todos os candidatos a fazerem campanha em todo o estado, com consequências e problemas de custo.
“Quem gasta mais consegue a vaga. Os 350 que mais gastaram estão no Congresso”. Além disso, Barroso apontou que, muitas vezes, o grande adversário é o outro candidato do próprio partido. “Isso personaliza o debate ao invés de institucionalizá-lo”.
Para ele, no entanto, o problema mais grave é o número de eleitos proporcionalmente, com a transferência de votos. “Atualmente, 93% foram eleitos com transferência de votos. O eleitor nem sabe quem elegeu. Só 7% foram eleitos diretamente. É um sistema que o eleitor não tem de quem cobrar, e o eleito não precisas prestar contas”, afirma o ministro.
Para solucionar essas causas do descolamento da classe política com o eleitorado, Barroso aponta que o voto distrital misto seria uma das possibilidades mais viáveis – diferente do voto em lista fechada (partido fornece) ou então o “distritão” (altos custos e puramente majoritário).
“Me alinho com a ideia de que o país deveria fazer uma experiência com o voto distrital misto. Na Alemanha, o eleitor tem dois votos. Um no distrito, e o segundo no partido. Isso combina os interesses, teria metade eleito por distrito e metade partidário”, diz.
Prioridades
A reforma mais urgente é a partidária, segundo o ministro. A primeira proposta seria acabar com as coligações nas eleições proporcionais, com o objetivo de “colocar fim a essa anomalia de partidos 35 registrados no TSE” com acesso ao fundo partidário, tempo de televisão, e nos quais alguns comportam donos. “É a propriedade privada ocupando o espaço público para fins privados”, afirma.
“As coligações ainda trazem consequências nefastas, como fraudar a vontade do eleitor. Por exemplo, o PT se coligou com o PR, e os partidos são diferentes com relação ao aborto do feto anencéfalo. Então, nos estados, um petista pode ter elegido um pastor evangélico”, exemplificou Barroso, ao comentar que é preciso também instituir a cláusula de barreira que traga restrições no funcionamento parlamentar – nesse momento, Barroso fez o mea culpa ao afirmar que o “Supremo carrega suas culpas”, ao julgar, em 2006, a inconstitucionalidade da cláusula de barreira.
“Não foi uma decisão feliz. O mundo mudou e ninguém acha que restringir os partidos é uma violação às minorias. Mas a história tem seu próprio ritmo. Já aguardamos por tempo suficiente essa mudança que se impõe”, disse.
Financiamento eleitoral
Barroso defende que o financiamento seja público e privado, mas de pessoa física e com teto razoável. Ou seja, exclui a participação de empresas. “Entretanto, isso é uma decisão política, tomada pelo Congresso, e não uma questão constitucional”, alertou.
Para o ministro, a própria decisão do STF sobre financiamento de campanhas não ficou clara, já que seus colegas utilizaram fundamentos diferentes. Desse modo, considerou que um dos principais problemas da lei é que ela não previa, por exemplo, que a empresa tomasse dinheiro emprestado de banco público e depois doasse para campanha, ou que empresas doasse para diversos candidatos.
“O problema não é a empresa participar ou não, mas deve ter regras mínimas sob pena de fomentar mais do mesmo, queremos mudar esse toma lá da cá”, apontou. O ministro lembrou que empresas apoiavam diversos partidos, o que poderia resultar em favorecimentos no futuro.
Por fim, Barroso reiterou o fato de que não se pode frustrar a cidadania, pois ela espera um modelo político que liberte o Brasil dos problemas e traga mais representatividade.
“O financiamento de campanhas é um foco de corrupção do qual precisamos nos libertar. A classe política deve atendimento a essa demanda por um mínimo de patriotismo e idealismo. Lembro da frase de Einstein, que diz ‘insanidade é continuar a fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes’. Precisamos fazer algo diferente”, apontou.
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